ANTES DE LER É BOM SABER...

CONTATO: (Whatsapp) 84.99903.6081 - e-mail: luiscarlosfreire.freire@yahoo.com. Este blog - criado em 2008 - não é jornalístico. Fruto de um hobby, é uma compilação de escritos diversos, um trabalho intelectual de cunho etnográfico, etnológico e filológico, estudos lexicográficos e históricos de propriedade exclusiva do autor Luís Carlos Freire. Os conteúdos são protegidos. Não autorizo a veiculação desses conteúdos sem o contato prévio, sem a devida concordância. Desautorizo a transcrição literal e parcial, exceto breves trechos isolados, desde que mencionada a fonte, pois pretendo transformar tais estudos em publicações físicas. A quebra da segurança e plágio de conteúdos implicarão penalidade referentes às leis de Direitos Autorais. Luís Carlos Freire descende do mesmo tronco genealógico da escritora Nísia Floresta. O parentesco ocorre pelas raízes de sua mãe, Maria José Gomes Peixoto Freire, neta de Maria Clara de Magalhães Fontoura, trineta de Maria Jucunda de Magalhães Fontoura, descendente do Capitão-Mor Bento Freire do Revoredo e Mônica da Rocha Bezerra, dos quais descende a mãe de Nísia Floresta, Antonia Clara Freire. Fonte: "Os Troncos de Goianinha", de Ormuz Barbalho, diretor do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte, um dos maiores genealogistas potiguares. O livro pode ser pesquisado no Museu Nísia Floresta, no centro da cidade de nome homônimo. Luís Carlos Freire é estudioso da obra de Nísia Floresta, membro da Comissão Norte-Riograndense de Folclore, sócio da Sociedade Científica de Estudos da Arte e da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência. Possui trabalhos científicos sobre a intelectual Nísia Floresta Brasileira Augusta, publicados nos anais da SBPC, Semana de Humanidade, Congressos etc. 'A linguagem Regionalista no Rio Grande do Norte', publicados neste blog, dentre inúmeros trabalhos na área de história, lendas, costumes, tradições etc. Uma pequena parte das referidas obras ainda não está concluída, inclusive várias são inéditas, mas o autor entendeu ser útil disponibilizá-las, visando contribuir com o conhecimento, pois certos assuntos não são encontrados em livros ou na internet. Algumas pesquisas são fruto de longos estudos, alguns até extensos e aprofundados, arquivos de Natal, Recife, Salvador e na Biblioteca Nacional no RJ, bem como o A Linguagem Regional no Rio Grande do Norte, fruto de 20 anos de estudos em muitas cidades do RN, predominantemente em Nísia Floresta. O autor estuda a história e a cultura popular da Região Metropolitana do Natal. Há muita informação sobre a intelectual Nísia Floresta Brasileira Augusta, o município homônimo, situado na Região Metropolitana de Natal/RN, lendas, crônicas, artigos, fotos, poesias, etc. OBS. Só publico e respondo comentários que contenham nome completo, e-mail e telefone.

segunda-feira, 18 de maio de 2015

EXUPERY E O BAOBÁ


Certo dia, conversando com Daliana Cascudo, neta de Câmara Cascudo, perguntei a ela sobre a informação que roda os quatro cantos do RN, anunciando que o Baobá da Rua São José, em Natal, foi a inspiração para Exupèry escrever O Pequeno Príncipe. Ela concordou comigo em com todo os que desmentem tal versão. Comecemos por Câmara Cascudo. Ele escreveu sobre todos os viajantes célebres que andaram em Natal. Suas Actas Diurnas que o digam. Não escapa ninguém. Inclusive muitos estiveram em sua casa, deixando suas assinaturas nas paredes. Câmara Cascudo nunca saiu de Natal por temporadas longas. Foi contemporâneo de Exupèry. Por que Cascudo nunca escreveu sobre a estadia de um aviador e escritor tão notável? Naquela época ele já era famoso. Por que nenhum jornal de Natal anunciou a visita de Exupéry? Mas veja mais abaixo detalhes sobre o fato.
A informação de que Antoine-Marie-Roger de Saint-Exupèry ter buscado inspiração para o seu famoso “O Pequeno Príncipe” no Baobá da rua São José ou no Baobá de Nísia Floresta é um curioso criacionismo, inclusive  o poeta Dr. Diógenes da Cunha Lima insiste que ele esteve em Natal. Chicuta Nolasco diz que ele hospedou-se na casa da Viúva Machado".
Os baobás desenhados pelo próprio Exupéry no livro O Pequeno Príncipe

Na realidade Exupèry nunca esteve no Rio Grande do Norte. E isso está provado por um estudioso da documentação aeronáutica. Ele perquiriu toda a documentação aeronáutica de voos da Europa para o Brasil, compreendendo todo o período de vida profissional de Exupèry, e não existe comprovação documental.
Sabe-se que aviões e navios empreendem viagens via carta – espécie de mapa que deve ser seguido. E tais não existem em nome de Antoine de Saint-Exupèry.

A maior ingenuidade é saber que Exupèry - que sobrevoou Dakar, no Senegal, incontáveis vezes - que se fartou de admirar inúmeros pores-do-sol e viu a beleza de vários baobás de todas as formas e tamanhos naquele país - tenha cismado justamente com um acanhado baobá fincado no meio de uma mata e tomado por arbustos. Li alguns livros de Exupéry e ele relata a beleza descomunal do pôr do sol nesse país africano. O pôr do sol rio Potengi é belíssimo, mas é ingênuo propagarmos a “tese” de alguns potiguares que afirmam que Exupèry ficou maravilhado com tal fenômeno. Lembremos que em Dakar os baobás estão para eles como bananeiras, mangueiras, jaqueiras e coqueiros estão para nós, no RN.
Esse é o Baobá de Nísia Floresta. Existiam 4. Restam 2, ou melhor, há 3, contando um exemplar bebê plantado num dos seus distritos.

Por que propagar uma fantasia com foros de história? Só porque se trata de um genial escritor francês?

Esses devaneios normalmente são criados para dar um aplomb a alguma causa defendida por alguém em busca de cristalização de sua própria memória em detrimento da história real. A propósito do baobá de Nísia Floresta especificamente, aplica-se o mesmo raciocínio essencial dessa reflexão. Cansei de ouvir que o baobá de Papari é o grande inspirador de Exupèry. É muita fantasia! É bom que as pessoas pesquisem mais e valorizem as verdadeiras lendas tricentenárias em detrimentos de lendas criadas por antigos clãs falidos que querem se reafirmar usando “lendas” direcionadas – intencionais – oportunistas.
Existem notícias e instituições que falam mais de quem a escreve que do fato em si. Isso não é política, jornalismo e sequer profissionalismo.
É bom que as pessoas não permitam serem enganadas, até porque a Nova História orienta-nos a construirmos a história com criticidade e clareza, e não com a mesma ingenuidade daquele bichinho que tem uma cruz natural desenhada nas costas. 


O BAOBÁ DE NÍSIA FLORESTA E O MITO EXUPÉRY
Exupéry

A África é o berço dos baobás, árvore diferente por seu aspecto singular. Uns acham-na feia e esquisita, outros vêem-na como exótica, bela e atraente. Mas algo é certo, um baobá não passa despercebido. Nativo das regiões tropicais da África, o baobá pode viver até dois mil anos. Também é conhecido por outros nomes. 
Dentro da cápsula parecida com um pinguim há bagas com polpa seca, muito azeda. O suco é delicioso com leite.
No Guiné-Bissau é fruta-pão-de-macaco, cabaceira, calabaceira; no Cabo Verde é embondeiro, imputeiro; em Moçambique é licondo; na Angola é melambeira e micondó; em São Tomé e Príncipe é molambeira; em Moçambique é molambo e na Angola é nebondo.
Essa é a bela flor do Baobá. Ela despenca por um tendão e fica virada para baixo.
Etimologicamente falando, o “baobá” é vocábulo de origem latina: “baobab”, em francês e “bu-ibab”, em árabe.

O Rio Grande do Norte possui dezenas de baobás espalhados em pontos distintos, como Apodi, Macaíba, Natal e outros municípios, testemunhando um passado remotíssimo, quando as placas tectônicas do Continente Americano ainda não tinham se separado do Continente Africano, onde os baobás são tão abundantes como são para nós tantas espécies brasileiras comuns.
Esse é o fruto do Baobá. Quando seca, as pessoas fazem pinguins (ave das zonas geladas do planeta). Depois de lixada e pintada vira belo artesanato.

Poucas pessoas sabem, mas o município de Nísia Floresta possui dois baobás adultos, e até na década de 1970 possuía cinco exemplares. O maior está no centro da cidade, outro na Fazenda Mãe-Ia, no Sítio Floresta, exatamente na divisa com a estrada, na altura do distrito de Golandi. O terceiro baobá – extinto – ficava próximo a entrada do município, nas imediações do engenho São Roque, num declive íngreme.  Com o advento da terraplanagem e urbanização, a terra da sua base foi deslizando, facilitando seu tombamento, após uma forte chuva do meado de 1970. Se naquela época existisse um nível de consciência mais cidadão por parte das autoridades, teria-se feito um trabalho de recolocação da espécime, às custas de tratores e guindastes, pois boa parte de suas raízes permaneceram fincadas no solo. A preciosidade de tal exemplar permitiria tais esforços. Faltou apenas visão. Os demais ficavam em Tororomba, onde, de fato foi plantado por um escravo negro. Hoje existem vários exemplares em Nísia Floresta, muitos novos. Quem passa por um sítio defronte ao "Bar do Bode", em Oitizeiro, vê um baobá novo, mas robusto. Em Tororomba vi outro, muito novinho, no "Sítio Traque".
Baobá nas savanas africanas.

O baobá pertence à família das bombacáceas, cujo nome científico é Adansonia digitata. Possui tronco extremamente grosso, galhos curtos, folhas comestíveis e flores branco-róseas, cujo branco se sobressai. Na África sua madeira, mole e porosa, é usada para confecção de embarcações e na produção de fibras, cordas, papel e tecido. A árvore do centro de Nísia Floresta costuma florescer de janeiro a março. Segundo se percebeu em 2010, sua floração superou todas as anteriores, conforme observaram os mais idosos. Supostamente isso aconteceu em decorrência da forte temperatura desse ano, fenômeno este também nunca visto.
Aqui a flor está completamente aberta.

Não apenas o visual do baobá é diferente. Suas flores são singulares. Elas despencam de um talo de aproximadamente 20 cm e se abrem como se estivessem de cabeça para baixo.

O mesmo fenômeno da multiplicação das flores ocorreu com os frutos, pois nunca se viu tantos como em 2010. Os frutos têm o formato de cápsulas oblongas (parecida com o corpo de um pinguim) e pubescentes (semelhantes ao veludo). Dentro se formam uma espécie de fibra que produz bagas secas, comestíveis. Em Nísia Floresta ouvi depoimento de pessoas que fazem suco do pó que sai dessas fibras e, segundo dizem, é delicioso, adquirindo uma consistência leitosa com facilidade. O sabor, exótico, lembra o gosto do tamarindo.
Dificilmente se encontrará um baobá igual Sua única característica em comum é parecer que está de cabeça para baixo 

O baobá de Nísia Floresta é tombado pela lei federal nº 4.771/65 e pela lei municipal nº 169/79. Consta em sua lateral uma placa informando que o exemplar foi plantado por um cidadão chamado Manoel de Moura Júnior, no ano de 1877. Acredito que isso seja pura pretensão, tendo em vista que a árvore é muito mais antiga do que informa a ingênua placa, conforme podemos constatar lendo mais aprofundadamente sobre tal espécie, a qual necessita de mais tempo de vida para ter o diâmetro e a altura atuais. O conteúdo da placa parece mais oportunismo, dentre tantas que povoam o imaginário popular.


FANTASIAS CONTADAS POR NATALENSES QUE SONHAM DEMAIS
"Baobá do Poeta" situado em Natal/RN, Rua São José 
Diógenes, em sua Natal Biografia de Uma Cidade, p. 278 a 279 diz que Antoine de Saint-Exupéry esteve na América do Sul, entre outubro de 1929 a janeiro de 1931, trabalhando para a Lattécoère como diretor da subsidiária Cia. Aeroposta Argentina. E diz que Pery Lamartine registrou a sua presença:


Como diretor e também aviador profissional, ele tinha um avião à sua disposição para fazer visitas a todas as bases de linha. Natal era uma das principais, pois aqui se faziam a baldeação das malas postais entre os navios (avisos) e os aviões e vice-versa. Assim sendo, Natal hospedava constantemente tripulações completas para substituir os pilotos da escala de voo. Essas tripulações conviviam cordialmente com a sociedade natalense, a exemplo de Jean Mermoz, que deixou aqui uma lembrança.”
Dr. Diógenes da Cunha Lima

Segundo o autor, Rocco Rosso, encarregado do setor de rádio e comunicação da Lattécoère, bateu fotos do escritor herói em Natal. Diga-se de passagem, tais fotos são desconhecidas pelos os historiadores. D. Amelinha Machado (viúva Machado), dona Nati Cortez e dona Nair Tinoco confirmam a importância da presença. Dona Nair lembra, em Outras recordações, as suas subidas à torre da matriz para apreciar o por-do-sol. Nilo Pereira foi-lhe apresentado por Jean Mermoz.

Diz ainda, o autor, que o escritor José Rafael de Menezes, em seu Amizades Bibliográficas, que não havendo tempestades nas costas nacionais, beber água de coco não seria tema de grandes manifestações literárias para o piloto, que se alternava entre duas paisagens: o deserto e as montanhas.

Rafael fala da “poética valorização do ser humano” e destaca: “O maior deles na década de 40, Antoine de Saint-Exupéry”. José Rafael registra ainda que “somente os colegas oriundos de Natal exibiam um autógrafo com o retrato do homem”. 
Alguém já viu uma cópia desse retrato em algum livro?

As mentes férteis comentam que foi em Natal que Exupéry fez os desenhos de O pequeno príncipe, seu livro mais famoso, lançado em Nova Iorque, em 1943. Diz-se que o francês viu com estranheza o baobá da rua São José, em Natal. Haja imaginação! Exupéry se fartara de ver os mais belos e portentosos baobás na África tão conhecida por ele, em sua rota de voo. Mesmo que ele estivesse passado por aqui, não se inspiraria justo num baobá tomado por garrancheiras e ainda de tamanho tão acanhado à época.
O Brasil possui muitos Baobás. A maioria está no Pernambuco. Esse está no Rio de Janeiro.

Há até quem pontue tópicos para reforçar a lenda. Leiamos os mesmos, na visão de Diógenes:

- O aviador hospedou-se na casa de dona Amelinha Machado, proprietária do terreno onde está o baobá;

- Há depoimentos que Exupéry teria declarado que o por do sol do Potengi é o mais lindo do mundo.

- O elefante, um dos desenhos do livro, é o símbolo do Rio Grande do Norte (a semelhança com o mapa do estado é sempre estilizado).

- Há desenhos de falésias, de dunas e de estrelas, que é o símbolo da cidade de Natal;

- No livro póstumo Cartas à sua mãe, há um trecho onde Exupéry diz que “Dacar é bem feia, mas o resto da linha, uma maravilha”. O resto da linha começava em Natal.
Uma espécia, na África.

É prudente analisarmos uma série de detalhes, tanto dos tópicos acima quanto do contexto da época. Fernando Hipólyto da Costa, um historiador respeitado, fez um levantamento de época, de todos os vôos Paris/Brasil e Argentina/Natal, tendo em vista a relação profissional de Exupéry com as plagas pampas, e sequer foi encontrado um registro de voo do citado francês para Natal.

Como Exupéry estranharia uma árvore a qual estava acostumado a ver em abundância e em todas as nuanças na África?
A tradição costuma comparar o mapa do RN a um elefante. Mas, convenhamos, é outra fantasia. Tem que se fazer força para se encontrar esse elefante. Lembra de longe e com esforço.

Por que Exupéry baseou seu elefante num mero mapa do Rio Grande do Norte – com diferenças gritantes do desenho real de um elefante – se ele estava habituado a ver elefantes ao vivo e em cores, na África?

Atribuir os desenhos de falésias, dunas e estrelas existentes no livro a Natal é muita imaginação, considerando que Exupéry era acostumado a ver tal cenário por quilômetros a fio quando sobrevoava a África. De dia e de noite.

Por outro ângulo, devemos entender – sem precisar se esforçar – que as estrelas do livro são óbvias ao contexto do desenho, pois ele retratou o planeta Terra com direito a céu. Por que tais estrelas, que existem no mundo inteiro, haveriam de ter sido inspiradas justamente nas de Natal/RN? O argumento “símbolo da cidade” é muito ingênuo. Ainda sobre céus e estrelas, o primeiro livro escrito por Exupéry, Correio Sul, é repleto de referências poéticas aos céus da África.

Sobre as palavras escritas pelo autor no livro Cartas à sua mãe: “o resto da linha, uma maravilha”, não significa dizer que se trate exatamente do RN. Embora tenha, de fato, rara beleza, é vago supor que ele esteve aqui.

Sobre o francês ter se hospedado na casa da dona Amelinha Machado – justamente encostada ao baobá – segundo o citado autor, e sobre todas essas suposições, fica uma lacuna incompreensível. Por que Luís da Câmara Cascudo, que registrou em livros sobre inúmeros viajantes brasileiros e estrangeiros ilustres que passaram em Natal, se esqueceu justamente de Exupéry?

Até hoje o clássico de Exupéry encanta crianças e adultos.
TROCANDO SUPOSIÇÕES POR DOCUMENTOS

Fernando Hipólyto da Costa, Coronel-aviador, historiador e vice-presidente do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte, escreveu que certa vez um cidadão lhe perguntou se tinha sido Exupéry quem plantara o baobá da rua São José, em Lagoa Seca, Natal. Ele riu, pois não podia ser diferente.

Segundo ele, Exupéry nunca foi partícipe dessa fase dourada da aviação comercial francesa, no que se refere às travessias Dakar-Natal-Dakar (3.200 km em cada trecho), ocasiões em que os tripulantes enfrentavam condições meteorológica diversas, o capricho dos ventos alíseos, os frios das Madrugadas e a imensidão de céu e água em viagens que consumiam 15 a 20 horas de voo.

O historiador recomenda a leitura detalhada da publicação francesa “Répertoire des Traversés Aériennes De L’Atlantique Sud Par L’Aéropostale Et Air France (1930-1940)”, escrita por Perre Labrousse em Paris em 1974. O livro lista todas as travessias, as quais, acaso Exupéry tivesse feito, estariam ali evidenciadas. Hipólyto, chamando esse contexto mítico de “absurdidades”, diz: “Se tudo passa na vida, a História fica e ela não perdoa os que não lhe entendem a lição”.
Baobá inspira até nome de Banda Musical...

No livro citado, é possível constatar 512 travessias (256 em cada sentido: Dakar-Natal ou Natal-Dakar), onde somente 4 não foram cumpridas, veja:

- Viagem 001-regresso, de 8 para 9 de julho de 1939. Motivo: amerrissagem forçada a 700 km de Dakar, em conseqüência de um vazamento de óleo de motor. Tripulantes e malotes do correio recolhidos pelo navio Phocée (“Aviso”). Foram voadas 14 horas a partir de Natal.

- Viagem 035-regresso, em 10 de fevereiro de 1936. Perdido no oceano depois de 7 horas de voo, na etapa Natal-Dakar. Perda total da aeronave e dos tripulantes, além de 1 passageiro.

- Viagem 074-ida, em 7 de dezembro de 1936. Motivo: Perdido no oceano depois de 3 horas e 57 minutos de voo. Perda total da aeronave e dos 5 tripulantes.

- Viagem 074-regresso. Não foi cumprida devido ao acidente constante na travessia anterior (074-ida). Seria a etapa Natal-Dakar.

A primeira travessia foi efetuada de 12 para 13 de maio de 1939, com o monomotor Late 28, matrícula F-AJNQ, sendo o primeiro voo realizado para o Brasil com malas postais. Apenas 3 tripulantes: Mermoz (piloto), Darby (navegador) e Gimié (radiotelegrafista).

A última (512, ou 256-refresso) ocorreu em 2 de julho de 1940, voando o F-AQCX de Natal para Dakar, com cinco tripulantes e tempo de voo de 15 horas e 51 minutos. A Air France suspendeu as atividades por se encontrar a Europa imersa na 2ª. Guerra Mundial.

O nome de Exupéry não consta nas relações de viagens. A empresa, que contava com treze aeronaves, destinava-se unicamente ao transporte de malas postais; em apenas dezenove travessias foram incluídos vinte e dois passageiros e esses somente viajaram com autorização expressa do presidente da companhia. E Exupéry não consta nessa relação.

O quadro de pessoal “aeronavegante”, na época pesquisada (1930-1940), compunha-se de dezessete comandantes, quarenta e um copilotos, 12 navegadores, dez radiotelegrafistas e 15 mecânicos; desse grupo de noventa e cinco tripulantes que operavam no Atlântico Sul, não é encontrado o nome de Exupéry.

O historiador Hipólyto pesquisou toda a documentação antiga referente a vôos de chegada e saída de Natal para outros países. E o nome de Exupéry não está entre os demais. Pesquisou também nos anais da Air France e informaram que ele nunca fez tal voo.
Formato curioso de um Baobá na África.

Interessante é o fato de Exupéry, enquanto escritor portador de uma verve literária de extrema sensibilidade, não ter registrado nada sobre Natal, acaso aqui tivesse colocado os pés. Assuntos não lhe faltariam. Concordam?

Diante desse quiprocó, por que insistem tanto se existem provas que ele nunca veio ao Rio Grande do Norte. Segundo o autor, a explicação é simples. Exupéry foi convidado pela Argentina a ocupar a gerência da Companhia Latécoère em Bueno Aires. Exupéry deixou a França viajando em navio de grande porte, chegando a capital portenha em outubro de 1929. Na ida o navio fez escala no Rio de Janeiro e Santos. No Rio ele teve algumas horas para conhecer a cidade, prosseguindo a viagem rumo a Argentina.

Regressando à França, após pouco mais de um ano, novamente por via marítima, Exupéry passou pelas mesmas localidades da ida. Tanto na vinda da Europa como no regresso para a França. Tanto na vinda de Europa como no regresso para a França, não ocorreu atracação no porto de Natal.

No livro “O caminho do avião”, de autoria de Luís da Câmara Cascudo, ele apresenta uma série de reportagens escritas de 1922 a 1933, acerca de 33 reides famosos com passagem para Natal. Por que o mestre da história do Rio Grande do Norte haveria de ter esquecido justamente de nome tão famoso e representativo? É lógico que Cascudo não o esqueceu. O que ocorre é que Exupéry nunca esteve por aqui.
Avenida dos Baobás

Os aviadores franceses também participaram das travessias aéreas do Atlântico Norte, existindo registros de 12 viagens de longa duração, consideradas “experimentais” e decorridas nos anos de 1938 e 1939.

As informações constam da publicação “La Ronde S’Arrête”, de autoria de George Bouchard, o qual tomou parte de todas as viagens.
Um registro importante na viagem n. 7 transcorrida de 7 a 10 de julho de 1939, Saint-Exupéry viajou como passageiro em aeronave de matrícula F-NORD, sob comando de Guillaumet, umas das “estrelas” da aviação francesa. 
Regressou à França (viagem n. 8) deixando os Estados Unidos em 14 de julho de 1939, com a mesma tripulação e novamente na condição de passageiros.

         E, AFINAL, QUEM FOI EXUPÉRY?

Antoine-Marie-Roger de Saint-Exupéry, seu nome de batismo, tinha a aviação como fonte de ação heróica e novo tema literário: exalta a aventura com riscos de vida como suprema realização humana. Sua obra é o testemunho singular de um piloto de guerra com a alma de poeta.
Antoine-Marie-Roger de Saint-Exupéry

Nasceu em Lyon, na França, em 29 de junho de 1900, oriundo de família aristocrática empobrecida. Obteve licença de piloto em 1922, no serviço, e quatro anos depois ingressou na aviação pela Latécoère. Ajudou a implantar rotas de correio aéreo na África, América do Sul e Atlântico Sul, além de ter sido pioneiro nos vôos Paris-Saigon e Nova York-Terra do Fogo. Nessa época, publicou seu primeiro livro Courrier-Sud (1929 – Correio Sul).

Exupéry soube aliar – e daí talvez a razão do seu permanente sucesso – a sensibilidade do artista a uma visão de mundo caracterizada pela autenticidade de quem só escreveu sobre o que de fato viveu. Permanentemente preocupado com os acontecimentos que o circundaram, seus livros refletem os problemas da sociedade e dos indivíduos de sua época.

O despojamento do estilo, a narrativa direta, a linguagem depurada de tudo que não contribui para a expressão concreta e imediata do que o escritor deseja contar, estão a serviço de um objetivo presente na obra inteira de Exupéry: o de dignificar a condição humana, o de reivindicar a sua essencial liberdade, sem abrir mão da complexidade – não raro feita das mais dramáticas contradições – que a define.

Na década de 1930, trabalhou como piloto de provas, adido de publicidade para a Companhia Aérea Air-France e repórter do Paris-Soir. Nomeado diretor da Cia. Aeroposta Argentina, exerceu o cargo até 1931. Em seu segundo romance, Vol de nuit (1931 – Voo noturno), exaltou os primeiros pilotos comerciais, que enfrentavam a morte no cumprimento do dever. Registrou suas próprias aventuras em Terre dês hombres (1939 – Terra dos homens).

Em 1939, apesar das dificuldades físicas causadas por acidentes aéreos, serviu na aviação aliada. Com a queda da França em poder dos Nazistas, fugiu para os Estados Unidos. Ali, escreveu Lettre à um otage (1943 – Carta a um refém), exortação a unidade dos franceses, e Le petit prince (1943 – O pequeno príncipe), fábula infantil para adultos , traduzida no mundo inteiro. Seu pessimismo aparece em Citadelle (1948 – Cidadela), volume póstumo de reflexões, no qual expressa a convicção de que o homem deve ser repositório dos valores da civilização.

Em 1943, voltou à força aérea no norte da África e morreu em missão, 31 de julho de 1944, participando de uma esquadrilha de bombardeiros da libertação da Sicília. Tendo ultrapassado o limite de idade para continuar pilotando, recebe a permissão para realizar mais cinco missões de reconhecimento. Numa delas desapareceu para sempre no mar.

Exupéry nunca se sujeitou à classificação de escritor profissional. De personalidade irriquieta, nada em sua formação (foi péssimo aluno) fazia crer que viesse a se tornar autor dos excepcionais livros que escreveu. Herói da segunda guerra mundial, dedicou todo o seu trabalho literário à defesa daquilo que o levou a morrer: a liberdade do homem.

CONCLUSÃO

Ficam aqui as provas de que Antoine de Saint-Exupéry esteve em Natal, sim, mas na imaginação fértil de tantos que preferem acreditar na “história da carochinha”, se pautando pelo hábito de dizer “foi fulano quem falou”, “ouvi dizer”, “dizem que” ou “o povo é quem diz”. Esse comportamento me recorda o depoimento de Rita Ribeiro, uma professora da UFMA, a qual, durante o lançamento do seu polêmico livro “Ana Jansen” – ocasião em que estive presente – informou à platéia que sofreu muitas críticas e até ameaças por ter revelado em seu livro a verdade sobre a referida personagem.

Nas suas pesquisas aprofundadas ela descobriu (com provas documentais) que figurões da história do Maranhão, com os seus nomes dados à diversas instituições, com direito a placas de bronze e enormes letreiros, foram verdadeiros crápulas. Nesse caso não me refiro a Exupéry, mas ao fato de existirem pessoas que, mesmo descobrindo a verdade, provada por documentos, preferem contar e recontar mentiras em livros e em palestras, prestando desserviço à história. Isso se agrava quando quem o faz muitas vezes atende ao adjetivo de “historiador ou “escritor”.

Ao apresentar as provas documentais, Hipólyto finalizou dizendo “E o tempo se encarrega de transmitir às novas gerações disparatados epílogos que não traduzem a realidade. De minha parte, posso afirmar à luz da História e com o apoio da documentação em meu poder, e ainda sem qualquer vacilação, que Antoine de Saint-Exupéry nunca esteve em Natal”.

Um fato bem curioso ocorreu em Natal, recentemente, quando o ex-prefeito Carlos Eduardo Alves, muito sensato e prudente, cancelou o projeto de colocar uma estátua do aviador francês na “Praça-do-pôr-do-sol” – que atendia sugestão justamente das pessoas que prestam desserviço à história -, as quais afirmavam que naquele lugar Exupéry costumava “assistir o crepúsculo vespertino sobre o rio Potengi”. Carlos Eduardo, com certeza constatou que, de todas as informações que dizem do Francês, ditas como passadas em Natal, nenhuma foi comprovada – nem com fotos – nem com escritos. O político pode nem ser lá essas coisas como homem público, mas, convenhamos, nesse episódio ele deu um show de sensatez e coerência. LUÍS CARLOS FREIRE.

quinta-feira, 7 de maio de 2015

História de Nísia Floresta

  • APRESENTAÇÃO

  • Ao longo das minhas pesquisas e divulgação acerca da história de Nísia Floresta Brasileira Augusta, houve quem fizesse a ingênua pergunta sobre quais foram as contribuições concretas que ela deu ao município onde nasceu. Outros sugerem que ela deveria ter ficado em sua terra natal e lutado por um município melhor. Este opúsculo permite ao leitor conhecer a vida e a obra dessa ilustre intelectual e entender o porquê das indagações acima. É primordial, principalmente aos nisiaflorestenses, ter o mínimo de conhecimento sobre essa figura intrigante, precursora de um ideário que em pleno século XXI ainda tem muito de atual. Trata-se da primeira mulher abolicionista do Brasil. Lutou pela liberdade de expressão e de culto. Lutou para que fosse dado às mulheres os mesmos direitos que as leis davam aos homens, como por exemplo, votar e ser votada numa eleição político-partidária. Lutou pela proclamação da república. Sua luta ocorreu muito antes de até mesmo nascer aqueles que ocupam as páginas dos livros didáticos, como sendo precursores de causas que sequer moveram uma palha. Isso revela o lado tirano da falsa História, escrita sob a luz da conveniência e politicagem. Nísia Floresta levou o nome do Brasil para os quatro cantos do Mundo, desmistificando muitos equívocos levados pelos viajantes estrangeiros que por aqui passaram ao longo dos séculos. Estudada pelas mais destacadas universidades do país, Nísia Floresta é um nome importante da história brasileira. Na oportunidade, com o advento do Concurso Público, torna-se ainda mais importante conhecer sua história. Esse material reúne informações que podem subsidiar as provas. Se pedissem uma frase que sintetizasse quem foi Nísia Floresta, penso que seria “Uma intelectual que nunca teve medo de lutar por justiça”.
Após vários anos estudando a vida e a obra de Nísia Floresta, o estudioso de sua obra, Luís Carlos Freire, escreve e dirige um documentário sobre a referida intelectual, rodado no município onde ela nasceu. - O evento se transformou num dos acontecimentos mais marcantes ocorridos no município, conforme pode ser visto  nas fotografias mais abaixo.
  • DEDICATÓRIA

  • Aos mestres do ‘Boi-de-Reis’ de Nísia Floresta: Canindé, Antonio e Benedito... pessoas fascinantes.
  • Dona Raimunda e dona Salete do ‘Pirão-Bem-Mole’.
  • Seres mágicos e insubstituíveis.
  • O tempo jamais apagará as suas memórias.
  • INTRODUÇÃO

  • I – NÍSIA FLORESTA EM PAPARI – UMA BREVE PERMANÊNCIA

  • No dia 12 de outubro de 1810 nascia a primeira filha do casal Dionísio Gonçalves Pinto Lisboa e Antonia Clara Freire, no sítio Floresta, em Papari, interior do Rio Grande do Norte. O bebê recebeu a versão feminina do nome do pai: Dionísia Gonçalves Pinto.
  • O senhor Dionísio havia chegado naquela região cheia de florestas nos primeiros anos do século XIX. Gostava de esculpir. É de sua autoria a figura de uma índia que traz sobre a cabeça uma pia na qual os padres lavavam as mãos antes da celebração, instalada na sacristia da Igreja Matriz de Nossa Senhora do Ó, em Papari (hoje Nísia Floresta – veremos sobre essa mudança de nome mais adiante).
  • Não se sabe exatamente se ele conheceu dona Antonia Clara Freire, a mãe de Nísia Floresta naquela região ou em Goianinha (onde a mesma tinha suas origens). O que se sabe é que ela era viúva e eles se casaram e foram morar no sítio Floresta. A mãe de Nísia Floresta era filha do Capitão-mor Bento Freire do Revoredo e de Mônica da Rocha Bezerra, a qual tinha uma filha chamada Maria Isabel do Sacramento, fruto do primeiro matrimônio. Além de Dionísia, o casal teve ainda dois filhos: Maria Clara e Joaquim Pinto Brasil. O que se sabe sobre dona Antonia Clara Freire é apenas o que ficou nos escritos da filha e nas entrelinhas, onde fica evidenciada a aura de uma mulher inteligente, decidida e de personalidade forte.
  • A primeira pessoa a registrar o nome da família de Nísia Floresta na história foi justamente um ilustre viajante inglês. Isso ocorreu em novembro de 1810, quando Dionísia contava com um mês de existência, quando o sítio Floresta recebeu a visita ilustre de Henry Koster. Em sua viagem pelo interior do Rio Grande do Norte, ele deparou-se casualmente com o pai de Dionísia e acabou se hospedando em sua residência, conforme consta no livro Viagens ao Nordeste do Brasil. Essa amizade breve demonstra o espírito liberal e hospitaleiro dos pais de Nísia Floresta.
Em 1992, o pesquisador Luís Carlos Freire da entrevista à TV Manchete, tendo encontrado no Teatro uma forma dinâmica para levar ao público a História de Nísia Floresta - A peça foi exibida inicialmente em São Luiz, no Maranhão, a convite da UFMA.
  • 2 – O INÍCIO DE UMA PERAMBULAÇÃO

  • Em 1817, chegou notícias de uma rebelião deliberada em Recife, fruto da revolta contra os abusos do poder estrangeiro, que ficaria popularizada como Revolução de 17, a qual tinha como meta a conquista de um governo local e autônomo.
  • O ambiente em Natal não era diferente. Em São José de Mipibu, cidade vizinha a 4 quilômetros, um dos mais importantes centros intelectuais do Rio Grande do Norte naquela época, o ânimo dos nativos mais intelectualizados se acirrava. Temendo uma abordagem ou ataque o Sr. Dionísio muda-se com a família para a Vila de Goiana, em Pernambuco, outro importante centro cultural do interior, no qual parecia se sentir mais seguro.
  • Goiana passaria a ter um importante significado na vida da jovem Nísia Floresta, conforme veremos ao longo desse estudo. Essa próspera Vila possuía o Convento das Carmelitas, onde as famílias de maiores posses confiavam a educação de seus filhos. Supostamente Nísia Floresta desfrutou do que tal instituição oferecia, mas não existem documentos que registrem essa suposição. Sabe-se que precocemente ela dominava algumas línguas estrangeiras, inclusive ensinava em sua própria residência, como era comum à época. Goiana era um ambiente de pessoas esclarecidas onde as ideias de justiça e liberdade fervilhavam. Ali floresceu importantes momentos históricos da História do Brasil. Goiana parece ter despertado às ideias visionárias que Nísia Floresta conservava adormecidas desde a adolescência.

  • 3 – O RETORNO A PAPARI E O CASAMENTO PRECOCE

  • Ainda em Goiana, nascia o irmão Joaquim Pinto Brasil, no dia 4 de maio de 1819. A outra irmã, Clara, já existia, mas não há registros do local. Tanto pode ter sido em Papari quanto em Goiana. As parcas notícias pertinentes a Joaquim nos são ofertadas no último livro que a intelectual escreverá: Fragmants d’un ouvrage inédit: notes biográfiques (Fragmentos de uma obra inédita: notas biográficas) (Paris, 1878), pois em nenhum outro escrito se encontram informações mais precisas. Após alguns meses de estadia em terras pernambucanas o Sr. Dionísio resolve retornar para Papari, pois o local passaria a se tornar inconveniente para ele enquanto português, inclusive a poeira da revolução havia sido baixada, mas a hostilidade dos nativos ainda era forte.
  • Em sua terra natal Nísia Floresta irá protagonizar um episódio não tão importante, mas que marcará a sua vida e propiciará toda sorte de comentários maldosos que sobreviverão até mesmo após a sua morte. Em 1823 ela se casa com Manuel Alexandre Seabra de Melo. Pouco se sabe sobre esse rapaz. Apenas que era filho de senhor de engenho das redondezas. Esse casamento não foi daqueles que os pais escolhiam para as filhas. Pelo contrário, ainda adolescente, não é difícil entender que ela se apaixonou espontaneamente pelo rapaz. Os pais não fizeram objeções. Naquela época a mulher casada era obrigada a viver sob as ordens do marido. Não tinham vida própria. Sair de casa: só para batizado e enterro. Isso foi contra toda a sua intelectualidade e ilustração. Ela queria escrever livros, conhecer outros países, mas houve um choque cultural entre o casal.
  • O casamento não dura demora um ano. Ela retorna para a casa dos pais. Ser uma mulher ‘separada’ consistia num grande escândalo, pois era “desonra” para os pais receber uma filha de volta. Diziam que “manchava a honra da família”. O marido a perseguirá por um bom tempo. Naquela época as mulheres ‘separadas’ eram levadas para casas de recuperação mantidas por freiras, sendo preparadas para reatarem o casamento. Algumas tornavam-se religiosas. As leis davam ao homem o direito de mandar a polícia atrás da esposas para busca-la à força.
  • Esse episódio incomum passará a ser um dos mais fortes em termos de preconceitos e acusações que Nísia Floresta sofrerá, cuja sua maior acusadora será sua própria conterrânea Isabel Gondim, a qual nunca a conheceu. Algumas pessoas dizem que o casamento de Nísia Floresta foi forçado, ou ‘encomendado’. Isso não condiz com a postura dos pais de Nísia Floresta, os quais sempre foram pessoas de espírito liberal e a apoiaram.
  • Poucos meses depois explode mais uma revolta, conhecida como Confederação do Equador. O Rio Grande do Norte torna-se hostil aos lusitanos, forçando o Sr. Dionísio a deixar Papari. Ele retorna a Vila de Goiana, a qual apresentava um cenário mais pacífico e passa a trabalhar como advogado. Em dezembro de 1824 a casa do Sítio Floresta é depredada e os bens da família são roubados.

  • 4 – O ASSASSINATO DO PAI E O SEGUNDO CASAMENTO

  • Num final de tarde do dia 17 de agosto de 1828, após retornar para sua residência, em Olinda, o Sr. Dionísio é alvejado por um tiro. Sua morte, embora ainda pouco explicada, é atribuída a uma questão que envolvia a sua profissão. Supõe-se ter ocorrido em decorrência da revolta da parte que havia perdido uma causa, na qual o Sr. Dionísio teria defendido os interesses da parte vitoriosa.
  • O que se sabe é que Nísia Floresta tinha horror a um tal Uchoa Cavalcanti, tido como o mandante do crime. Nos próprios escritos de Nísia Floresta ficaram os registros de que pessoas muito poderosas de Olinda não suportavam mais ver aquele advogado ganhando causas contrárias aos seus interesses.
  • Como vimos acima, as penas de Goiana escreveriam algumas páginas da história de Nísia Floresta. Supostamente quando esteve nessa vila em sua adolescência, conheceu um jovem de idade equiparada, era Manuel Augusto de Faria Rocha. Ela o encontraria em Olinda, logo após o assassinato do seu pai, e passaria a residir em sua companhia. A propósito quando passou a viver na França ficou conhecida com o sobrenome do marido Mme. De Faria, inclusive a Biblioteca Nacional de Paris registra esse nome.
  • Aos 12 de janeiro de 1830, nasce em Olinda Lívia Augusta de Farias Rocha, a qual seria a grande companheira da mãe. Em 1831 nasce um segundo filho, mas morre recém-nascido. Ainda neste ano Nísia Floresta inaugura a sua verve de escritora no jornal Espelho das Brasileiras, direcionado ao público feminino. Nele a iniciante aborda aspectos da mulher em culturas antigas.
  • Percebe-se logo a sua aptidão para a defesa do seu sexo no seio de uma sociedade onde o homem era quem dava as cartas e a mulher era praticamente um objeto. Futuramente os assuntos seriam abordados com mais maturidade e acidez, até porque ela possuía um estilo direto. O que era admirável a um sistema de tantas represálias.
O pesquisador Luís Carlos comentando sobre Nísia Floresta à ocasião da gravação do documentário.
  • 5 – ESCRITORA PRECOCE – O SURGIMENTO DE UMA PIONEIRA

  • Após tornar públicas as suas opiniões com certeza ela pensou fazê-lo de forma mais substancial e plena. Dessa forma, em 1832 publica “Direito das mulheres e injustiça dos homens”, inaugurando então o seu famoso pseudônimo: Nísia Floresta Brasileira Augusta. Nota-se que, ao invés de ocultar seu verdadeiro nome – como forma de fugir às represálias – como alguns podem supor – ela cria um pseudônimo que diz muito, ademais ela se assumia enquanto autora do que escrevia. Nísia, de Dionísia; Floresta, para lembrar o sítio onde nasceu; Brasileira, um sinal de nacionalismo; e Augusta, uma evocação ao grande amor da sua vida: Manuel Augusto. Interessante é que, desmanchando as suposições preconceituosas de alguns, os quais passariam a atribuir a denominação “Augusta” a Auguste Comte, fica aqui a necessária observação que na realidade ela homenageou o homem que amava e que escolhera espontaneamente.
  • Direito das Mulheres e Injustiça dos Homens”, como já vimos, foi inspirado na obra de Mary Wollstonecraft – Vindication of the rights of women (Reinvindicação dos direitos da mulher), de 1792. Mas é importante destacar que ela não fez apenas uma tradução literal. A autora absorve de forma antropofágica o ideário estrangeiro e denuncia os preconceitos, os tabus e todo tipo de discriminação praticada no Brasil contra a mulher por parte dos próprios brasileiros.
  • Ela questiona a superioridade masculina e elenca todo um conjunto de situações que podem tornar a mulher tão competente quanto o homem, inclusive superior, acaso lhe seja dado o simples direito de estudar. A propósito critica as injustiças cometidas pelo sexo tido como forte, o qual tira o direito de as mulheres mostrarem o seu potencial.
  • O referido livro, que inaugura o feminismo no Brasil, com certeza causou escândalo, pois mexeu com os brios de um sistema no qual jamais se pensou encontrar tais questionamentos.

  • 6 – NO MEIO DO CAMINHO OUTRO RIO – O RIO GRANDE DO SUL

  • Em novembro de 1832, Manuel Augusto de Faria Rocha conclui o bacharelado em Direito na Academia de Olinda e se muda com a esposa para Porto Alegre, no Rio Grande do Sul. Junto seguem Lívia, Maria Isabel e Clara. Joaquim Pinto Brasil ficou em Olinda, tendo em vista iniciar o curso de Direito.
  • São muitas as suposições acerca dessa mudança de um extremo ao outro. Alguns estudiosos supõem que o primeiro marido vivia em seu encalço com o objetivo de processá-la por adultério. As leis da época eram rigorosas nesse aspecto e davam ao homem esse direito.
  • Muitas mulheres da época de Nísia Floresta se sujeitavam a viver com senhores que não tinham a mínima afinidade para poupar-se dos escândalos que protagonizariam a sociedade acaso se separassem. Pesa ainda o fato de muitos maridos se ampararem nas leis que os favoreciam de maneira incomum, a ponto de desmoralizar o nome da esposa rebelde.
  • Sobre a viagem para o Sul supõe-se também ter sido decidida em virtude do convite de um irmão de Manuel, o qual lhe ofereceu uma oportunidade interessante de emprego. Na capital dos pampas nasce Augusto Américo de Faria Rocha no dia 12 de janeiro de 1833. Uma coincidência com o dia e mês de Lívia. Mas o ninho feliz vem a ser terrivelmente abalado no dia 29 de agosto, com a morte repentina do jovem marido.
  • Nísia Floresta fica muito abalada, mas sua determinação lhe dará condições de superar terrível perda ao lado da mãe, irmãos e filhos. A partir de então ela passa a ensinar em sua residência, ficando responsável pelo sustento da família.
  • Ela permanece mais quatro anos em Porto Alegre, reedita “Direito das mulheres e injustiças dos homens”. Sua irmã Maria Isabel casa-se com um rapaz da família Silva Arouca. O irmão, Joaquim Pinto Brasil, para sua decepção, casa-se precocemente em Pernambuco.
  • Uma nova experiência será vivenciada pela norte-riograndense com a Guerra dos Farrapos, permitindo a mesma travar contato com Giuseppe Garibaldi, famoso italiano responsável pelo comando da Marinha do Rio Grande do Sul. Mas o ambiente não se torna positivo para uma mulher com tamanha responsabilidade. Dessa forma, em 1833 ela se transfere com a família para o Rio de Janeiro. Mais uma vez um novo lugar. Uma nova vida.

  • 7 – RIO DE JANEIRO – PRECURCIONISMO, “ESCÂNDALOS” E AUDÁCIA
  •                                                      
  • No Rio de Janeiro Nísia Floresta encontrará um ambiente propício para dar vazão às suas aspirações de educadora, pois havia grande interesse pelo ensino em meio a uma realidade de escolas dominadas por estrangeiros. Nesse espaço ela irá se inserir, mesmo desagradando a alguns diretores que não viam aquela mulher separada e sem diplomas com bons olhos. Ela tem consciência que a "moda" é colocar filhos em colégios de estrangeiros, num claro sinal que bastava vir da Europa para ser bem aceito.
  • No dia 31 de janeiro de 1838 o jornal traz um anúncio apresentando o Colégio Augusto:

  • “D. Nísia Floresta Brasileira Augusta tem a honra de participar ao responsável público que ela pretende abrir no dia 15 de fevereiro próximo, na rua Direita, nº 163, um colégio de educação para meninas, no qual, além de ler, escrever, contar, coser, bordar, marcar e tudo o mais que toca à educação doméstica de uma menina, ensinar-se-á a gramática da língua nacional por um método fácil, o francês, o italiano e os princípios mais gerais da geografia. Haverão igualmente nesse colégio mestres de música e dança. Recebem-se alunas internas e externas. A diretora, que há quatro anos se emprega nessa ocupação, dispensa-se de entreter o respeitável público com promessas de zelo, assiduidade e aplicação no desempenho de seus deveres aguardando ocasião em que possa praticamente mostrar aos pais de família que a honrarem com a sua confiança, pelos prontos progressos de suas filhas, que ela não é indigna da árdua tarefa que sobre si toma”.

  • Além do pseudônimo o Colégio Augusto reforça a homenagem ao marido falecido, para o qual ela dedicará sempre algumas linhas de seus escritos. Após algum tempo o colégio é transferido para a Rua Dom Manuel, n. 20, com entrada pela Travessa do Paço, n. 23, defronte ao Palácio da Justiça.
  • Na condição de mulher atualizada, poliglota e leitora voraz, que desde cedo buscava conhecimentos na biblioteca do pai, reunia qualidades que lhe davam condições de criar e manter uma escola. Seu espírito visionário lhe possibilitará implantar uma pedagogia moderna e destoante das encontradas em outros colégios. E tal medida receberia muita rejeição, pois algumas críticas anônimas passariam a ser estampadas em alguns jornais, e supostamente oriundas de diretores de escolas, enciumados.
  • Interessante é que os artigos faziam ironia ao ensino de latim e a dimensão mais abrangente que o Colégio Augusto dava às línguas estrangeiras, como por exemplo as seguintes linhas: “Trabalhos de língua não faltaram; os de agulha ficaram no escuro. Os maridos precisam de mulher que trabalhe mais e fale menos”. Na realidade havia uma resistência contra uma concorrente que tinha diferencial, inclusive trazia um currículo de escritora, cujos escritos enalteciam a mulher, igualando o seu potencial intelectual ao homem, escrevia em jornais e fazia conferências.
    Bandeira do município de Nísia Floresta
  • Um ano depois de chegar ao Rio de Janeiro ela já encontra campo propício para publicar a terceira edição de “Direito das mulheres e injustiças dos homens”, inclusive anunciou-o no jornal do Comércio de 25 de abril desse ano, informando que o livro se encontrava a venda a Casa do Livro Azul, na rua do Ouvidor, 121, por 55 réis.
  • Em 1840, o irmão, Joaquim Pinto Brasil, conclui o curso de Direito em Olinda e vem morar no Rio de Janeiro com a família. Após residir em algumas cidades, passa a morar na capital, trabalhando como advogado e ensinando no famoso Colégio Pedro II. Futuramente se tornará chefe da Secretaria do Ministério da Agricultura e fundador do Instituto Psicológico, inclusive publicará um importante livro.
  • O espírito público e a audácia de Nísia Floresta não limitavam a sua coragem de expor seu pensamento, mesmo residindo a pouca distância do Monarca D. Pedro II. Ela sabia logicamente do fim que levavam as pessoas que ensaiavam a liberdade de expressão, mas ignorava, fazendo conferências contra a escravidão, defendendo a liberdade de culto doutrinário e a federação das províncias. Nos jornais escrevia contra o monopólio estrangeiro no comércio e na educação.
  • Vários autores que escreveram sobre ela evocam tais palestras, enaltecendo o seu estilo liberal. Inês Sabino, em Mulheres Illustres do Brazil assim escreveu: “os espectadores saiam dali deslumbrados não só pela presença agradável da jovem senhora, como pela audácia da sua inteligência de primeira água e ainda mais... um horror para aquele tempo!... por ousar a ilustre dama falar em abolição e em federalismo”. (SABINO: 19..., 154).
  • Nesse interim Maria Clara, irmã de Nísia Floresta, casa-se no Rio de Janeiro com o Dr. José Henrique de Medeiros, um português lorde da Casa Real de Portugal.
  • Em 1842 ela publica Conselhos a minha filha, em homenagem a Lívia Augusta de Faria Rocha, na passagem do seu aniversário. Em 1845, publicou a segunda edição, incluindo 40 pensamentos em versos. Posteriormente publica duas vezes em língua italiana (1858 e 1859), em francês (1859). Aos olhos atuais o livro soa um pouco antiquado. A autora evidencia os deveres e as virtudes de uma boa filha, enaltecendo valores como simplicidade, respeito e obediência aos pais, valorização da pessoa idosa e uma generosidade especial ao oprimido.
  • Em 1847, publica no Rio de Janeiro três novos livros voltados para as alunas do Colégio Augusto: “Dacys ou a jovem completa”, “Fany ou o modelo das donzelas” e “Discurso que às suas educandas dirigiu Nísia Floresta Brasileira Augusta”. Em 1853 publica “Opúsculo Humanitário”; “O abismo sob as flores da civilização”, “Uma passeio no Jardim de Luxemburgo” e “A mulher”, os quais são trabalhos voltados a educação. Esses três últimos trabalhos foram publicados em 1859 no livro “Scintille d’un’anima brasiliana” (Cintilações de uma alma brasileira).
  • “Opúsculo Humanitário” é a compilação de artigos que foram publicados nos jornais do Rio de Janeiro, o qual apresenta de forma breve o pensamento de Nísia Floresta sobre a educação formal e informal de meninas. O livro evidencia uma mulher culta e com experiência pedagógica e administrativa. Ela analisa a história da condição feminina em diversas civilizações. Na sua concepção o desenvolvimento e o atraso no qual as referidas mulheres estão inseridas – e o próprio país – logicamente – pode ser explicado pela não participação das mulheres nas sociedades enquanto seres pensantes.

  • Um passeio ao jardim de Luxemburgo”. O jardim de Luxemburgo ficava a poucos metros da residência de Auguste Comte, o fundador do Positivismo. Com certeza nesse lugar ela deve ter passado horas fazendo reflexões. Esse livro traz reflexões muito claras ao positivismo, inclusive ela chega a elogiar o referido filósofo, com o qual manteve uma grande amizade – embora tenha durado menos de um ano -, pois ele morreu muito novo.
  • É muito fácil encontrar pessoas dizendo que Nísia Floresta era positivista e que trouxe a referida doutrina para o Brasil, mas isso é inverídico. Ela trata essa corrente com respeito tendo em vista haver uma valorização da função da mulher não apenas como dona de casa, mas como ser pensante. Sobre isso é bom lembrar das palavras do próprio filósofo quando diz que ela era muito metafísica.
  • No livro “A mulher”, Nísia Floresta, perplexa, faz reflexões sobre o hábito de as mulheres francesas mais abastadas levarem seus filhos muito pequenos para aldeias rurais para serem cuidados por uma espécie de empregadas distantes (ou amas-de-leite). Era grande o número de crianças mortas ou abandonadas e isso não tocava os pais, pois preservavam tal prática. A brasileira faz críticas ácidas a esse procedimento, inclusive destaca o valor da amamentação e a importância do calor maternal na formação da criança.
  • Em 1849 a escritora publicará um dos seus livros mais polêmicos “A lágrima de um Caeté”. Trata-se de um imenso poema de 712 versos, no qual podemos entender a sua forma diferente dos outros indianistas em comentar o índio brasileiro. Logicamente são evidenciadas as características típicas do romantismo em voga, onde com poucas palavras ela descortina um cenário de natureza de rara beleza, colocando o índio no centro de tudo e destaca os seus valores.
  • Muito diferente, por exemplo de José de Alencar, o qual às vezes chega a deixar Peri semelhante a um cavaleiro medieval europeu, Nísia Floresta assusta quando apresenta um índio submisso e revoltado com a opressão motivada pelos europeus. Mas além de tratar a questão indígena, evoca outra tendência romântica: os conflitos políticos ao qual a sociedade estava eventualmente inserida.
  • Nesse poema a autora faz reflexões sobre a derrota dos liberais na Revolução Praieira, ocorrida em 1848, em Pernambuco. Dá voz aos povos indígenas através da sua pena, reclamando a degradação dos nativos, associando o desfecho dos fatos à revolução, a qual deu cabo a vida de tantos intelectuais revoltosos que ousaram gritar contra a coroa portuguesa, seu autoritarismo e seus desmandos. Já naquela época ela evidencia a perda da identidade dos nossos índios. Mostra-nos um índio não inocente sem endossar as teorias europeias que os caracterizavam como detentores de uma bondade natural. E esse clamor não significa o fim da Revolução Praieira, mas em maior grau o fim da resistência indígena diante dos opressores europeus.
  • Interessante destacar que nesse livro Nísia Floresta lançou outro pseudônimo: Telesila, numa alusão a heroína grega. A autora revela uma personalidade forte, incitando a resistência. Ao criticar o autoritarismo do governo e o privilégio dado aos estrangeiros ela parece não temer encontrar pela frente a guilhotina que tantos encontraram.

  • 8-FRANÇA

  • No ano seguinte Nísia Floresta embarcou com os filhos para França a bordo da galera Villi de Paris. Sua filha Lívia Augusta sofrera um acidente ao cavalgar e o médico indicou um tratamento comum à época “mudança de ares”. Há quem diga que sua saída temporária do Brasil é explicada por receio às consequências do conteúdo do livro “A lágrima de um Caeté”, mas, como já refletimos, o estilo da escritora não dá margens para isso.
  • Outros fomentam estórias que ela recuou um pouco em decorrência das inúmeras calúnias publicadas em jornais, muitas delas irônicas e debochadas, empreendidas por pessoas anônimas, ora contra o colégio, ora contra a sua proprietária. Algumas calúnias chegavam ao ponto de violar sua intimidade. Tais calúnias seriam mais tarde resgatadas, incentivadas e até cultuadas por uma das suas conterrâneas: Isabel Urbana de Albuquerque Gondim, que mesmo sem ter conhecido pessoalmente Nísia Floresta, escreveu em 1884, ano antes da morte desta, um verdadeiro dossiê com acusações graves, as quais supostamente nunca chegaram ao conhecimento da escritora.
  • Tendo passado mais de um mês em alto-mar Nísia Floresta chega a Paris. No Arquivo Nacional de França, na seção de passaportes consta o seguinte: “Mme. Augusta, Nísia Floresta Brasileira – 39 anos, acompanhada de seu filho e sua filha. Origem: Rio de Janeiro. Domicílio real: Rio de Janeiro. Destino: Paris. Profissão: Rendas”.
  • Em 1850, mesmo ausente, Nísia Floresta tem um livro seu publicado no Brasil: Dedicação de uma amiga”, assinado com as iniciais B. A. São dois volumes. No Dicionário Bibliográfico de Inocêncio o autor diz que a obra provavelmente é composta de quatro volumes, mas apenas dois foram publicados.
  • Em 1851 a intelectual integrava o público que assistia as conferências do curso de História Geral da Humanidade, ministradas pelo filósofo Auguste Comte no Auditório Palácio Cardinal, em Paris. Mas ela só iria travar contato com o filósofo em 1856. Ainda em 1851 Nísia Floresta viaja para Portugal e fica até janeiro de 1852, quando embarca para o Brasil no navio Treviot.
                      

  • 9 – O RETORNO AO BRASIL

  • Familiares recebem a família de Nísia Floresta com festa. O Jornal das Senhoras, datado do dia 22 de fevereiro de 1852, de propriedade de Joana Paulo Manso de Noronha saudou a escritora e informou sobre sua vida na Europa.
  • Em 1855, ela vivenciará a triste experiência da doença da mãe. E justamente no mês em que o marido morreu, dona Antonia Clara Freire morre em 25 de agosto. Com certeza teria sido pior seu sofrimento se ela estivesse ausente. A morte de sua genitora, a do pai e a do marido, todas ocorridas em agosto será constantemente lembrada pela autora como a “tríplice perda”, por isso ela passou a considerar tal mês como “funesto”.
  • Essa passagem é destacada no texto intitulado “O pranto filial”, e no “O Brasil Ilustrado”, de 1856, onde Nísia Floresta expõe sua nostalgia e a tristeza por tais mortes. Isso permite aos estudiosos de sua obra observar o estilo que a autora tinha de expor certas particularidades de sua vida.
  • Nesse período o Rio de Janeiro é assolado pela febre amarela e Nísia Floresta passa a trabalhar voluntariamente na enfermaria do Hospital de Nossa Senhora da Conceição, situado na rua da Quitanda, n.40 ajudando as vítimas. Em 1856 ela edita “Pensamentos” – um livro de versos.
  • É interessante destacar a importância que Nísia Floresta ocupa na história do Brasil, tendo em vista ter chamado a atenção da sociedade para pensar os horrores da escravidão – fazendo-o de forma assumida e publica muito antes de a princesa Isabel nascer. Tal gesto era inédito até mesmo a homens letrados – pois nem todos tiveram tal coragem – imagine a uma mulher.
  • Supostamente Nísia Floresta vem a ser precursora, enquanto mulher, na defesa da abolição da escravidão no Brasil, pois outro registro diz respeito a Maria Firmina dos Reis, no Maranhão, autora de Úrsula, escrito em 1859. Outras mulheres também viriam a abraçar publicamente a causa ao longo do tempo, como por exemplo, Luciana de Abreu, Ismênia Santos, Narcisa Amália, Ana Aurora do Amaral Lisboa, Revocata de Melo, Maria Amélia de Queiroz, Luíza Regadas, dentre outras.
  • Tais nomes, incluindo o de Nísia Floresta, não são tão conhecidos, tendo em vista o papel secundário que as mulheres tinham no seio da sociedade enquanto pessoas públicas e formadoras de opinião. A palavra de uma mulher não tinha o peso da voz masculina.

  • O Brasil parecia estar cego diante dos países do seu entorno, restando sozinho com o regime escravocrata. A Europa e a América do Norte já haviam declarado extinta a escravidão há tempos. Nísia Floresta lançava o seu grito questionando o governo por ser adepto de tal sistema e ao mesmo tempo proclamar-se liberal, numa ridícula contradição. Livros como “A lágrima de um Caeté”, de 1849; “Opúsculo Humanitário”, de 1853; “Passeio ao Aqueduto da Carioca”, de 1855; e “Páginas de uma vida obscura”, de 1855 abordam a escravidão –, uns numa dimensão mais profunda e ácida –, outros de forma mais sutil. Seu interesse sempre foi permitir aos brasileiros enxergar tal regime como vergonha cristã e gesto de desumanidade. A propósito perguntava o que dava autoridade a uma raça – no caso a branca – para ter tanto poder sobre a outra – a negra.
  • Futuramente “Cintilações de uma alma brasileira”, de 1859; “O Brasil”, de 1871; os dois volumes de “Três anos a Itália seguidos de uma viagem a Grécia”, de 1864 e 1874 também abordariam o assunto, onde percebemos que da primeira referência à escravidão à última ela foi lapidando suas reflexões. Em “A lágrima de um Caeté” percebe-se sutis críticas ao tráfico de escravos. Em “Opúsculo Humanitário” ela trata longamente o assunto. Apenas em “Três anos a Itália, seguidos de uma viagem à Grécia” a autora prega a abolição de forma explícita.
  • Outra preocupação da autora diz respeito às observações feitas na Europa, onde entendiam o Brasil como um país de selvagens, de doenças, enfim com diversos preconceitos. No livro “O Brasil”, de 1871 (publicado inicialmente em francês e depois em italiano) ela descortina um panorama muito diferente do propagado, apresentando sua rica e vasta natureza, enaltece a formação intelectual do seu povo, as revoltas em prol da sua independência. Seus escritos são otimistas – e ufanistas. Ela leva o leitor a concordar que sua pátria tem quase tudo para um futuro promissor.

  • 10 – A SEGUNDA VIAGEM À EUROPA

  • No dia 10 de abril de 1856, Nísia Floresta embarcou com sua filha Lívia Augusta para a segunda viagem à Europa. Optou por deixar seu filho Augusto Américo no Rio de Janeiro, onde estudava. Lívia estava com 16 anos e sua mãe só retornaria ao Brasil 16 anos depois.
  • Essas viagens empreendidas solitariamente e de forma decidida também possibilitam diversas reflexões, pois ela precisava se organizar muito bem para ausentar-se de seus familiares, deixar o Colégio Augusto e seus bens aos cuidados de outros. Dessa forma a instituição estampa pela última vez informações sobre os cursos ali ministrados e, após dezesseis ou dezessete anos de funcionamento o polêmico educandário é extinto.
  • Pode-se pensar que a intelectual, por mais que se esforçasse, não encontrava em seu país o alimento para a sua intelectualidade. Não havia campo para suas ações de pessoa culta e interessada em prestar serviço sociedade de forma concreta. Ela detinha alto conhecimento, mas não havia como colocá-lo em prática. Até mesmo a questão das relações interpessoais não era interessante para ela, tendo em vista que as mulheres, por não possuírem nível de conhecimento semelhante, formavam uma barreira na comunicação.
  • Logicamente que a dimensão das suas discussões não se resumia a livretos de reza, receitas culinárias, afazeres domésticos, e quando muito, romances franceses cheios de melodrama – tão comuns às donas de casa da época – com raras exceções.
  • A França, considerada berço da cultura e do conhecimento – à época – a atraia justamente por possuir toda uma estrutura, na qual intelectualmente havia espaço para o campo das ideias. Obviamente que, assim como no Brasil, o conhecimento avançado era privilégio masculino. Mas a dimensão e a profundidade como fluía na França, principalmente em sua capital, e a possibilidade de darem acesso às mulheres, permitiam a Nísia Floresta a opção de buscá-lo.
  • O fato de Nísia Floresta ter conhecido Auguste Comte, em 1856 e ter mantido com ele uma sólida amizade, inclusive com troca de correspondências, evidencia o nível intelectual dessa brasileira, pois o filósofo, profundamente estudioso não perderia seu precioso tempo, da mesma forma como ela o fez no Brasil. Certamente se tivesse ficado conversando sobre receitas de bolo e assuntos de almanaque suas limitações intelectuais seriam grandes.

  • A amizade entre Comte e Nísia Floresta assinala um ponto muito significativo na história do Positivismo. Não que ela tenha contribuído com a construção dessa doutrina, mas pelo fato do seu fundador enxergar na brasileira a pessoa ideal para participar da mesma e divulgá-la. A brasileira o recebeu algumas vezes em sua casa, tanto quando residiu na rua d’Enferm, 11, quanto na rua Royer Collard, 9, a qual ficava próxima ao Jardim de Luxemburgo, da
  • Universidade de Sorbone e da Rua Monsieur Le Prince, 10, onde residia Auguste Comte. Esse contato durou pouco, pois em menos de um ano após tê-lo conhecido o filósofo morre. Nísia Floresta acompanha o amigo até sua derradeira morada, o Cemitério Père Lachaise, juntamente com Sophie Bliaux, filha adotiva de Comte, de Mme. Laveyssière, irmã de Sophie, e de Mme. Maria Robiet, esposa de um positivista francês.
  • As correspondências trocadas entre ambos foram guardadas por e encontradas depois por familiares. Diferente do que alguns apregoam – insinuando ter havido relacionamento amoroso entre os dois – revelam assuntos completamente opostos. Essas correspondências tratam de agradecimentos pelo envio de um retrato ou de um livro, doenças e tratamento homeopático, votos de pesar pelo aniversário de morte de Clotilde de Vaux, a mulher que estava na vida de Comte na mesma dimensão com que Manuel Augusto estava na vida de Nísia Floresta. Quem ler a história de Comte constatará o amor platônico do famoso filósofo por Clotilde de Vaux.
  • Qualquer epístola da época primava pela arte da caligrafia, elegância na escrita e romantismo. Tais características tinham imenso significado, mas nesse sentido o que se nota é apenas a escrita romântica comum. Interessante também ressaltar que a letra da brasileira, diferente dos típicos desenhados da época, não era bonita. Tais cartas estão na Igreja Positivista do Brasil, no Rio de Janeiro, cuja primeira esta datada de 19 de agosto de 1856 e a última no dia 29 de agosto de 1857.
  • Em Paris, na Maison d’Auguste Comte, museu em homenagem ao filósofo, estão expostas as cartas escritas por Nísia Floresta. A primeira é de 19 de agosto de 1856 e a última é de 1º de julho de 1857, num total de seis cartas. Ivan Lins documentou no livro História do Positivismo no Brasil o relato de um senhor de engenho pernambucano feito ao positivista Antonio Pereira Simões, o qual descreveu a participação de Auguste Comte numa reunião na casa de Nísia Floresta, em Paris, conforme também registrou Adauto da Câmara. A brasileira o saudou com grande reverência, destacando a importância do filósofo naquele encontro.

  • 11 – O AUGE DE UMA INTELECTUALIDADE

  • Em 1857, quando José de Alencar trazia a público o Guarani, Nísia Floresta editava em ParisItinèraire d’un Voyage en Allemagne (Itinerário de uma viagem à Alemanha), com o pseudônimo Mme. Floresta A. Brasileira. Ela organizou o livro em forma de trinta e quatro cartas direcionadas para o filho e aos irmãos, comentando de forma incomum os inúmeros lugares que percorreu na Alemanha.
  • Muito diferente dos tradicionais relatos de viagens da época, a autora descreve a própria subjetividade, a ponto de se colocar no centro da narrativa, dando a impressão que tudo girava em torno dela. O livro acaba assumindo um lado biográfico da autora, pois traz informações de sua vida, nome dos filhos e irmãos, as datas de morte da mãe e do esposo, dentre inúmeros fatos relacionado a sua família. Esse trabalho foi mostrado a Machado de Assis, mas certamente ele pensou tratar-se de mais um tradicional relato de viagem, pois sequer leu.
  • Logo em seguida ela visita Roma, Nápoles, Florença, Veneza, Verona, Milão, Torino, Livorno, Pádua, Mântua, Pisa, Mombasilio e Mandovi e conheceu várias cidades da Sicilia e da Grécia.
  • Em Florença assistiu a cursos de Botânica, ministrados por Parlatore, um antigo colaborador de Humboldt. Ela já havia assistido aulas dessa matéria no Colégio da França e no Museu de História Natural, conforme registrou. Também nessa cidade italiana publicou “Scintille d’un anima brasiliana (Cintilações de uma alma brasileira), em 1859, assinando Floresta Augusta Brasileira, que contém cinco ensaios: “O Brasil”, “O abismo sob as flores da civilização”, “A mulher”, “Viagem magnética”, “Um passeio ao Jardim de Luxemburgo”.
  • Em 1860 a autora publica em língua italiana “Le lagrime de un Caeté (A lágrima de um Caeté). Seu tradutor – Ettore Marcucci -, além de um prefácio elogioso, anexou quarenta e uma notas sobre o vocabulário, fazendo relação do poema com versos de Dante, de Ariosto, e até mesmo com a Bíblia.
  • Em 1861 Nísia Floresta retorna a Paris. Em 1864, lança o primeiro volume de “Trois ans en Italie, suivis d’un Voyage en Grèce” (Três anos a Itália, seguidos de uma viagem a Grécia), assinado “par une brèsiliene” (por uma brasileira). Escrito em forma de um diário de viagem Nísia Floresta nos surpreende ao mostrar a maneira como os italianos vivem, a cultura popular e as histórias desse povo. Tendo vivenciado o período da Comuna e a revolução em prol da unificação da Itália, a autora acaba documentando fatos que muito contribuem com a história desse país.
  • Em 1865, na Inglaterra, é a vez de presentear o público com “Women” (Mulher), que integra um dos ensaios de “Cintilações de uma alma brasileira”, traduzido Pela filha, Lívia Augusta. Em 1867, publica em Paris o romance “Parsis”. Apesar de constar na própria bibliografia da autora nunca foi encontrado um exemplar, mas com certeza não seria difícil, numa busca mais apurada, encontrá-lo em alguma biblioteca ou arquivo histórico europeu. O grande problema do nosso país é exatamente os recursos para financiar uma pesquisa mais aprofundada pelo Velho Mundo.
Lançamento do documentário, em Brasília/DF.
  • Em 1871 é a vez de mais um ensaio de “Scintille d’un anima brasiliana” ir a público: “Brèsil (Brasil). O livro é traduzido por Lívia Augusta Gade. A única novidade sobre a filha querida de Nísia Floresta é que a mesma se casara com um alemão e ficara viúva quatro meses depois. Tal qual sua genitora, permaneceu viúva até a morte. Uma falha por parte do governo norte-riograndense decorre do fato de terem a oportunidade de fazer uma ampla pesquisa sobre Nísia Floresta e sua filha, tendo em vista que o intelectual Henrique Castriciano correspondeu-se com Lívia Augusta. Mas nada foi feito, inclusive a aquisição de bens da escritora, os quais estariam integrando hoje um memorial.
  • Em, Paris semelhante ao clima brasileiro vivenciado por ela nas revoluções de 1817 e 1824 e a própria Farroupilha, o ambiente torna-se ameaçador. A Comuna assume o poder e dá origem a um governo republicano e socialista, o qual passa a enfrentar a monarquia. A confusão está formada e o resultado é bombardeio na capital. Muito sangue é derramado até o seu aniquilamento, em 1871.
  • Tais fatos nos são informados por Nísia Floresta em “Fragmentos de uma obra inédita”, inclusive relata sua experiência de se hospedar na residência de pessoas amigas no interior da França para proteger-se. E o fez muito bem, pois tendo retornado se depara com tudo destruído em sua residência. Ela deixa Paris rumo a Londres e depois Portugal, embarcando sozinha para o Rio de Janeiro. Sua filha optou por ficar na Europa, pois tendo passado a maior parte da sua vida no Velho Mundo, com certeza não sentia necessidade de retornar ao Brasil.
  • Em 1872 é publicado em Paris o segundo volume de “Trois ans en Italie, suvis d’un Voyage en Grèce (Três anos na Itália, seguidos de uma viagem a Grécia). Nísia Floresta usa o pseudônimo Une Brésilienne (Uma brasileira). Em 23 de maio desse mesmo ano, a revista O novo Mundo, de J. C. Rodrigues, de Nova York, estampa uma abrangente notícia com a biografia da escritora com retrato.

  • 12 – A ÚLTIMA VIAGEM AO BRASIL

  • Em 1872, Nísia Floresta desembarcava num Rio de Janeiro muito diferente do que ela havia deixado. A campanha abolicionista, a qual ela havia sido uma das iniciadoras, estava amadurecida e organizada, conduzida por intelectuais de prestígio, inclusive com espaço em jornais. O que era inadmissível alguns anos antes. Mas nada disso representava êxito, pois o Governo que se proclamava liberal – o Império ilhado por repúblicas – permanecia aparentemente indiferente. Algumas leis haviam sido adotadas com relação aos escravos, mas de forma que os poderosos tirassem sempre proveito.
  • A Lei Rio Branco fora uma delas. Somava-se a isso o movimento republicano que crescia cada vez mais. Certamente Nísia Floresta percebeu que, apesar de não ser o Brasil que esperava, muito havia mudado e que grandes mudanças estavam prestes a ocorrer na próxima década.

  • 13 – O RETORNO DEFINITIVO PARA A EUROPA E A PERDA DO IRMÃO

  • Nísia Floresta passou pouco tempo no Brasil. Em 24 de março de 1875, retorna à Europa pela Inglaterra. Se encontra com a filha, demoram um pouco em Londres e vão para Portugal, permanecendo em Lisboa. No dia 9 de novembro desse mesmo ano, o irmão Joaquim Pinto Brasil morre no Rio de Janeiro de pleuropeumonia. Lívia estava distante e seria informada vários dias depois, em Ventnor, na Inglaterra.
  • O último trabalho de Nísia Floresta foi ao público em 1878 em Paris: “Fragments d’un Voyage inédit – notes biographiques (Fragmentos de uma obra inédita – notas biográficas), e mais um pseudônimo é lançado: Mme. Brasileira Augusta. Dedicado a sua irmã Clara, ela dedica a maior parte das páginas para falar do irmão Joaquim Pinto Brasil, permitindo assim conhecermos a sua própria biografia.
  • Nísia Floresta estava tocada pela morte do irmão, ocorrida um ano antes e supostamente iniciou os primeiros rascunhos sob o manto do luto. Esse livro foi reeditado no Brasil, na década de 2000, pela jornalista Nathalye Bernardo Câmara.
  • Infelizmente Nísia Floresta não deixou nada escrito que explicasse uma significativa mudança de endereço, mas algum tempo após a publicação desse livro muda-se para Rouen, cidade medieval, cenário de onde Joana D’Arc foi queimada viva e de um desfile de índios brasileiros que causou frisson nos franceses no século XVI.

  • 14 – UMA CARTA NO MEIO DO CAMINHO

  • Em 1884 (um ano anos da morte de Nísia Floresta) a conterrânea Isabel Urbana de Albuquerque Gondim, nascida 23 anos após Nísia Floresta, escreveu uma imensa carta a um tal J. F. Souto (pessoa desconhecida na História do RN) na qual denigre Nísia Floresta do início ao fim. Trata-se de uma ação inexplicável, tendo em vista que ambas não se conheciam. OBS. Esse trecho foi retirado tendo em vista constar de 70 páginas e não representar relevância para esse material de estudo. Se alguém tiver interesse é só acessar o meu blog: nisiaflorestaporluiscarlosfreire

  •                                                                
  • 15 – MORRE “MME. BRASILEIRA AUGUSTA”

  • Aos 24 de abril de 1885, a brasileira notável morre em conseqüência de uma pneumonia. Seu sepultamento acontece semanas depois em um jazigo perpétuo no Cemitério de Bonsecours. Os jornais de Rouen não anunciaram o fato e nenhum outro periódico europeu. O que nos leva a supor que ela escolheu Rouen para afastar-se da vida movimentada que havia tido, onde o dinamismo, as viagens e os estudos foram uma constante. Ela não queria mais ser notícia. Sua missão estava cumprida. Rouen representava um ninho silencioso, no qual encontrou paz.
  • Na alvenaria gelada do cemitério de Bonsecours Lívia mandou esculpir as seguintes palavras: “Aqui jaz minha mãe Nísia Floresta Brasileira Augusta. Nascida em 12 de outubro de 1810. Falecida em 24 de Abril de 1885”.
  • O Brasil só tomou conhecimento da morte da escritora na segunda quinzena de maio, através de convites para missas e breves informações sobre a mesma, feitos pela família. Por exemplo: “Faleceu em Ruão, França, onde desde alguns anos se achava, D. Nísia Floresta Brasileira Augusta, escritora cujo nome é conhecido nas letras pátrias. Por muitos anos exerceu aqui no Rio de Janeiro o mister de educadora do sexo feminino, e da operosa tarefa a que se impusera, larga foi a sua compensação que encontrou nas muitas discípulas que lhe fizeram e ainda lhe fazem honra” (O País, 27.5.1885).
  • Alguns pesquisadores afirmam que Nísia Floresta deixou alguns trabalhos inéditos como: “Inspirações maternas”, “Viagem a Itália, Sicília e Grécia em 1858 – 1859” e “Memórias de minha vida”. É provável que tal afirmação proceda, até porque a intelectual era muito dinâmica e afeita a escrita. Como percebemos, ela realizava diversas atividades literárias em curto espaço de tempo. Existem livros que foram reeditados em anos seguidos. Em outros casos, enquanto reeditava um, lançava outro. Mas até o momento nenhum pesquisador encontrou os livros citados.
  • Na sessão de Registros de Falecimentos do Arquivo Departamental de Rouen existem poucas informações sobre o inventário de Mme. Faria. Para grande surpresa pode-se ler: “Certificado de Indigência Viúva Faria, Manuel Augusto Profissão: Rendas Local de falecimento: Bonsecours Idade:74 Data de falecimento: 24 de abril de 1885”.
  • Não há quem não estranhe esse fato, o qual representa uma antítese diante do que se pensava – e que somos levados a pensar – sobre Nísia Floresta, pois a mesma tinha uma vida pautada por sucessivas viagens e publicação de livros. Para tanto necessitava-se viver em fausto. Essa informação deixa uma enorme interrogação, tendo em vista que muito tempo depois, sua filha Lívia Gade foi localizada e vivia muito bem financeiramente. Teria essa expressão outro significado?
  • A julgar por tais informações podemos supor que seus últimos anos de vida, diferentes dos anos áureos de tantas publicações e vendas, foram sem nenhuma renda para a brasileira. Supõe-se que a mesma vivesse da renda oriunda das propriedades que a família possuía no nordeste do Brasil. No endereço onde Nísia Floresta residiu, em Rouen, na Grande Route, nº 121, está a provável residência que tenha lhe servido de abrigo até a sua morte. Trata-se de uma casa simples, de pedras e tijolos à vista.
  • 16 – HOMENAGENS E O ENCONTRO COM A FILHA DE NÍSIA FLORESTA.

  • A história da filha mais ilustre da antiga Papari não se encerrará com sua morte. Nísia Floresta, a incansável viajante ainda fará outra viagem. E será realmente a última. Logo após a sua morte ocorre uma sucessão de lembranças e esquecimentos acerca de sua memória, mas aos poucos sua memória irá se impondo, graças a ações de admiradores e intelectuais que, num verdadeiro quebra-cabeça, irão montando sua história.
  • Quem primeiro pensou em divulgar o nome de Nísia Floresta em nossas terras foi o Centro do Apostolado do Brasil em 1888, no Rio de Janeiro, o qual levou ao público as “Sete cartas inéditas de Auguste Comte a Nísia Floresta”. Para os positivistas era orgulho divulgar o nome de uma brasileira que tinha conhecido com o pai do Positivismo.
  • Coincidentemente a abolição da escravidão ocorreu nesse mesmo ano, o que não foi nada mais que a culminância da luta e do sonho de tantos brasileiros audaciosos, onde se incluía de forma destacada o nome de Nísia Floresta.
  • Seu filho Augusto Américo de Faria Rocha morreria quatro anos depois, aos 12 de março de 1889. Os que o conheceram o descreveram como homem singular, de finos tratos, um educador inato. Certo norte-riograndense descrevia o filho de Nísia Floresta da seguinte forma: “de pequena estatura, gordo, com barba e cabelos ruivos e anelados, andava sempre apoiado em uma bengala.
  • Muito afável, todos gostavam dele por sua bondade, que, às vezes, dava lugar a uma firme energia e autoridade”. (Diário de Notícias de 22 de outubro de 1950). O mesmo foi professor e diretor do Colégio Santo Agostinho e Colégio Augusto (não se trata do colégio de sua mãe). Nesse colégio, situado na capital do Rio de Janeiro, estudou Washington Luiz Pereira de Souza, o qual veio a se tornar presidente do Brasil. O mesmo foi interno no período de 1885 a 1887.
  • Um abnegado em prol de investigações sobre Nísia Floresta foi Henrique Castriciano, o fundador da Escola Doméstica. Ele fez importante levantamento, mas não publicou. Passou suas pesquisas para Adauto da Câmara, que publicou no Rio de Janeiro, pela Editora Irmãos Pongetti, História de Nísia Floresta, primeiro livro sobre a escritora, em 1941. Grande parte do que se sabe sobre ela foi garimpado por esse ilustre intelectual, o qual correspondeu-se com Lívia Augusta, em Cannes. Nesse aspecto cabe uma reflexão sobre a oportunidade única que o estado do Rio Grande do Norte teve e perdeu.
  • Se na ocasião das correspondências trocadas entre Castriciano e Lívia tivesse havido a preocupação de adquirir o acervo e até mesmo móveis e objetos da escritora, de sua filha e afins, hoje teríamos um memorial riquíssimo, enfim seria muito atraente para um memorial.
Luís Carlos Freire apresentando um trabalho sobre Nísia Floresta na UNICAMPI 
  • Castriciano assim se referiu a Nísia Floresta, em 1908: “Poucos brasileiros conhecem esse nome. Entretanto ele é o de uma das mais fortes mentalidades femininas desse país” e ainda dizia que Nísia “teve a existência atormentada, intensa e gloriosa”.
  • O Rio Grande do Norte parece ter se preocupado em evocar o nome de Nísia Floresta de forma mais substancial somente em 1909, justamente na data a qual pensavam que ela havia nascido. No dia 12 de outubro erigiram próximo ao local que acreditam ter sido sua residência, um monumento em homenagem ao seu centenário. A iniciativa foi do Congresso Literário e do Atheneu Norte-Riograndense, apoiados pelo governador Alberto Maranhão.
  • A partir de então outras homenagens se seguiram, como um artigo de Constâncio Alves, publicado no Jornal do Comércio em 21 de outubro de 1909. Na realidade foi a reprodução do que a Revista New World, de New York havia publicado no auge da carreira da intelectual e no Dicionário Bibliográfico Brasileiro, de Sacramento Blake. Mas não deixou de ter grande repercussão, pois raros eram os brasileiros que conheciam o teor de tal material.
  • Em 1911 a praça batizada com o nome de um célebre intelectual potiguar – que coincidentemente fez história na França - Augusto Severo, foi escolhida para abrigar um medalhão de bronze com a imagem de Nísia Floresta, feito em Paris pelos escultores Corbiniano Vilaça e Edmond Baboche.
  • A ideia também foi de Henrique Castriciano. A peça, muito simples, figurava a efígie da intelectual, uma estrela de granito, incrustações de bronze e as datas de nascimento e de morte. Infelizmente esse conjunto que nas palavras de Nilo Pereira era uma “pequena obra-prima de delicadeza, expressão, de arte” não existe mais, pois no dia 25 de outubro de 1949 roubaram o medalhão e aos poucos o restante foi sendo destruído.
Acertando com a Comandante Paula Rossner, a participação do Comando Naval de Natal nas gravações do documentário.
  • O fato foi amplamente divulgado pela imprensa local. Muito tempo depois o medalhão foi encontrado num ferro velho e entregue ao Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte.
  • No dia 26 de abril de 1912 Lívia Augusta morre e é enterrada ao lado da mãe, em Rouen. Ambas tiveram destino parecidos, pois após ficarem viúvas, jamais se casaram novamente. Lívia viveu mais na França que no Brasil. Para lá partiu aos 19 anos, em 1849, falecendo aos 82 anos. Foram 63 anos de vida no Velho Mundo, tendo morado na Inglaterra, Itália, França, Alemanha e em Portugal.
  • Lívia Augusta parece ter optado – ou se acomodado – a uma vida muito diferente da mãe. Há registros de que tenha trabalhado como preceptora. Era poliglota, inclusive traduziu um dos livros de sua mãe. Mas nada mais a destaca.
  • Em novembro de 1919, Oliveira Lima discursou longamente sobre Nísia Floresta, no dia da formatura da primeira turma da Escola Doméstica de Natal. Para ele Nísia Floresta era “a mais notável mulher de letras que o Brasil produziu, quer pela amplitude da visão, quer pela suavidade do estilo”. Sobre o pseudônimo da intelectual escreveu: “nome disparatado (...) e esdrúxulo na sua mistura do arcádico e patriótico” (Jornal A República, 28.11.1919).
  • Em 1924, o escritor maranhense Reis de Carvalho profere uma palestra sobre Nísia Floresta no Centro de Cultura Brasileira no Rio de Janeiro. Se no Rio Grande do Norte – terra de admiradores – as informações eram escassas, no Rio de Janeiro as dificuldades seriam maiores. Exatamente a falta de dados levou Reis de Carvalho a não apresentar novidades. Mas foi muito bem recebida e divulgada.
  • Em Goianinha, interior do Rio Grande do Norte, no entanto não aconteceu o mesmo. Dr. Joaquim Grillo fez uma conferência no aniversário de morte da escritora, em 24 de abril de 1924, mas divulgou informações erradas e acabou por manifestar opinião desabonadora sobre a conterrânea. A homenagem acabou se tornando um dossiê de acusações.

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  • 17 – NOVAMENTE ESQUECIDA E NOVAMENTE LEMBRADA

  • Os anos se passaram e Nísia Floresta permaneceu quatro décadas quase esquecida. O pouco que se sabia sobre ela estava envolto em muito preconceito. A carta escrita em 1884 por Isabel Gondim, encarregava-se de alimentar as mais absurdas e mentirosas informações. O ideal para um estado pouco desenvolvido e para a velha Papari, parada no tempo, era evitar propagar um nome que trazia desconforto.
  • Em 1926, Raimundo Teixeira Mendes traduziu e publicou alguns trechos de “Três anos a Itália, seguidos de uma viagem à Grécia” no Extrato de publicações positivistas no Rio de Janeiro. Na ocasião erigiram na Praça da República do Rio de Janeiro um monumento denominado Monumento de Benjamin Constant, incluindo-se a imagem de Nísia Floresta entre grandes nomes que se tornaram públicos em defesa da escravidão, como a Princesa Isabel, Castro Alves e outros.
  • Em 1928, é publicado em Paris “Auguste Comte et Mme. Nísia Brasileira – Correspondance (Augusto Comte e Nísia Floresta – Correspondência). Essas cartas apesar de seus conteúdos terem sido revelados – e publicados –, como vimos acima, têm grande peso na difamação dos seus autores. Alguns insistem em dizer – irresponsavelmente – que ambos foram amantes e as cartas tratam desse relacionamento. Em 1998 fui convidado para falar sobre Nísia Floresta a uma turma de alunos na UFRN e fiquei surpreso quando um conceituado professor afirmou isso, como se conhecesse tais cartas, até então não publicadas.
  • Em 1933, no Rio de Janeiro, Roberto Seidl publicou o ensaio “Nísia Floresta -1810-1885 – vida e obra de uma grande educadora, precursora do abolicionismo, da República e da emancipação da mulher no Brasil”. O título, muito pomposo, não atende ao conteúdo apresentado, no qual o autor reproduz dados biográficos e tece ligeiras reflexões sobre a autora. Não houve novidade.
  • Em Porto Alegre, Fernando Osório dá uma grande contribuição à história de Nísia Floresta, publicando em Mulheres Farroupilhas o manuscrito “Fany”, uma novela escrita pela potiguar, a qual se encontrava desaparecida. O exemplar foi-lhe presenteado pelo Dr. Antonio Augusto Borges de Medeiros.
  • Em 1938 a Federação das Academias de Letras reedita “A lágrima de um Caeté”, trazendo estudo crítico de Modesto de Abreu. Infelizmente a publicação traz erros de impressão que deturpam uma série de versos. Como se não bastasse escreve logo na introdução opinião desmerecendo a dimensão do trabalho de Nísia Floresta.
  • Numa carta escrita por Henrique Castriciano, aos 25 de julho de 1938, dirigida a Adauto da Câmara, encontramos uma informação muito importante – e decepcionante – na qual ele informa que a edição das correspondências trocadas entre Nísia Floresta e intelectuais europeus perdeu-se num naufrágio. Tais informações foram obtidas vinte e sete anos antes, quando Henrique Castriciano comunicou-se com Lívia Gade, por correspondência, em Cannes, em 1911.
  • Adauto da Câmara, que publica em 1941 o livro História de Nísia Floresta, com o resultado de investigação junto a arquivos e bibliotecas, e com o material que recebeu de Henrique, muito lutou para conseguir o atestado de óbito de Nísia Floresta através do Itamaraty, mas nunca obteve êxito. O Consulado Geral do Brasil, no Havre, apesar do empenho, informou não haver encontrado nada na Prefeitura de Rouen, com relação ao registro de morte da brasileira. A situação era difícil.
LUÍS CARLOS FREIRE DANDO DEPOIMENTO SOBRE NÍSIA FLORESTA PARA O DOCUMENTÁRIO: NÍSIA FLORESTA: UMA MULHER À FRENTE DO SEU TEMPO - BRASÍLIA/DF
  • 18 – PAPARI TORNA-SE NÍSIA FLORESTA

  • Em 1948 Papari passa pela sua quarta mudança de nome: originalmente Papari, Vila Imperial de Papari, Vila de Papari, Papari e finalmente Nísia Floresta. A mudança deu-se através do decreto-lei nº 146, do dia 23 de dezembro de 1948, de autoria do deputado Arnaldo Barbalho Simonetti.
  • O fato vem a ser um dos mais curiosos na história do município, pois assinalou transformação na visão sobre a conterrânea. Ou pelo menos aparentou. Não há registros de que tenha havido rejeição ou atitude semelhante.
  • Entre homenagens e esquecimentos o preconceito oscilou por muito tempo. O nome da ilustre potiguar que tanto defendeu os índios é escolhido pelo indianista Marechal Rondon para um posto indígena em Pernambuco.

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  • 19 – SEU TÚMULO É LOCALIZADO EM ROUEN

  • Em fevereiro de 1950, o jornalista Orlando Ribeiro Dantas, fundador do Diário de notícias do Rio de Janeiro empreende uma rigorosa busca na França até localizar o túmulo em Bonsecours, arredores de Rouen. Até então ninguém supunha o local onde Nísia Floresta havia sido sepultada. Através da lei 1.892, de 23 de junho de 1953, do Ministério da Educação, o governo brasileiro recebe autorização para trasladar os despojos da intelectual para o Brasil.
  • O encarregado de tomar todas as providências em Rouen foi o Dr. Marciano Alves Freire, presidente do Centro norte-riograndense, no Rio de Janeiro. No dia 9 de agosto de 1954, ele embarca em Marselha no navio Loide-Brasil com a urna funerária, chegando em Recife o dia 5 de setembro.
  • Um problema burocrático ocorreu assim que os funcionários da alfândega constataram que a “mercadoria” citada no documento se tratava de restos mortais de uma pessoa. Mas a sorte estava do lado dos que sempre sonharam com aquele momento. Um conterrâneo de Nísia Floresta, nada menos que o Presidente da República Café Filho, interferiu com um telefonema e pediu que liberassem o ataúde.
  • 20 – NÍSIA FLORESTA CHEGA EM NATAL

  • No dia 11 de setembro de 1954, a imprensa carioca, pernambucana, paulista e potiguar estampam fotos da intelectual com notícias sobre a chegada dos despojos a Natal. Ocorreram diversas homenagens na Base Naval com a presença das mais representativas autoridades. O caixão ficou exposto a população, sob guarda da Marinha e Aeronáutica, ao som de bandas de música.
  • Dr. Alfredo de Moraes, comandante do navio que trouxe os despojos da intelectual, descreveu com emoção a urna no convés e a chegada em Natal, sob pompa de chefe de estado. Coincidentemente o mesmo veio a se tornar presidente da Igreja da Humanidade no Rio de Janeiro,
  • A celebração da missa de encomendação do corpo ficou sob responsabilidade do Monsenhor João da Mata Paiva, coincidentemente originário de família de Papari. No mesmo dia os Correios lançam nacionalmente um selo comemorativo ao traslado dos restos mortais de Nísia Floresta, cuja estampa apresentava um retrato da intelectual bem madura.

  • 21 – NÍSIA FLORESTA RETORNA A PAPARI

  • No dia 12 de setembro finalmente o ataúde chega ao município de Nísia Floresta. Depoimentos de nativos ainda vivos que presenciaram o evento afirmam que a pequena e acanhada cidade ficou pequena para tantos veículos e pessoas. Ocorreu uma missa de corpo celebrada pelo Monsenhor Rui Miranda. Em 2006, entrevistei o referido religioso, já muito idoso, em Ceará Mirim, e fiz um relatório sobre suas informações sobre o fato.
  • Diversas autoridades discursaram, recebidas pelo prefeito José Ramires. A Academia Norte Riograndense de Letras, juntamente com a prefeitura do município haviam mandado construir uma base quadrada de alvenaria para abrigar a caixa com os restos mortais. Eles não imaginavam que receberiam um caixão tradicional.
  • Nísia Floresta havia sido embalsamada, inclusive seu corpo estava semi-intacto, a ponto de na ocasião ser possível ver suas feições. Outro fator que colaborou com o estado de conservação do corpo foi o chão gelado de Rouen, tão próximo da fria Inglaterra. Pode-se supor que a insigne brasileira almejasse ser sepultada na sua inesquecível Floresta. Nilo Pereira testemunhou a abertura do caixão e deixou o seguinte depoimento:

  • “Haviam dois caixões, um de zinco e outro de ébano. Ao abrirmos este último, subiu um cheiro que eu chamei de múmia: mofo concentrado. Cheiro de morte velha. Ela estava levemente reclinada. Os cabelos passavam dos seios. Dava para ver bem a fisionomia. Não devia ter sido bonita a nossa Nísia. Bonita por dentro, isso sim”. (Jornal Tribuna do Norte, 26.05.1985).

  • Diante da novidade do ataúde tiveram que guardá-lo por alguns meses no interior da Igreja Matriz de Nossa Senhora do Ó, até que a referida academia providenciasse o túmulo, o qual supõe-se estar construído a poucos metros de onde existiu a casa dos pais da intelectual.
  • Inicialmente houve indisposição entre a Academia Norte-Riograndense de Letras e a Prefeitura de Nísia Floresta, tendo em vista que o prefeito havia firmado com a instituição o compromisso de construir o túmulo e não o fez. Os jornais divulgaram que o caixão com o corpo da escritora estava esquecido na Matriz. Diante do impasse a Academia empreendeu uma campanha para conseguir a estrutura necessária e assim o túmulo foi feito, abrigando finalmente o ataúde.
  • Ao longo do tempo seguiram-se diversos eventos e homenagens evocativas à ilustre brasileira. Na sua cidade de nascimento seu nome foi dado a uma escola estadual. Em Porto Alegre é nome de rua e patrona da cadeira 17 na Academia Literária Feminina no Rio Grande do Sul. No Rio de Janeiro, além de ser nome de rua, detém uma cadeira na Academia Nacional de Ensino de Letras e Artes, na antiga Academia Academia Feminina de Letras e Artes.
  • Em Recife também é nome de rua, e seu retrato, pela primeira vez pintado em cores, por Balthasar da Câmara, se destaca numa imensa tela exposta na Fundação Joaquim Nabuco, no ato da sua inauguração, em 29 de abril de 1977. Curiosamente, foi a primeira mulher a integrar esse espaço, no qual jazem homenageados Santos Dumont, Dom Vital, Duque de Caxias, José de Alencar e outros renomados vultos históricos. Na Ala Feminina da Casa Juvenal Galeno em Fortaleza, detém a cadeira nº 6; na Academia norte-riograndense, em Natal, é patrona da cadeira nº 2 e nome de um acanhado beco no bairro da Ribeira.
  • Seu nome se destacou durante o Concurso organizado pelo Conselho Nacional dos Direitos da Mulher em 1988, cuja temática principal foi o preconceito no livro didático.
Luís Carlos Freire dando entrevista para a TV Universitária/UFRN, à ocasião da gravação do Documentário: "A Chegada dos despojos de Nísia Floresta em 1954, de autoria do mesmo.
  • 22 – HOMENAGENS CONTEMPORÂNEAS

  • Em 1981, a escritora nisiaflorestense Socorro Trindade publica Feminino Feminino, pela Editora Universitária de Natal, postulando incluir o nome de Nísia Floresta como precursora na recente história do feminismo brasileiro. Em 1982, o professor Francisco das Chagas Pereira traduz pela primeira vez em língua portuguesa o livro “Itinerário de uma viagem à Alemanha”, pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte, em Natal.
  • Ainda nesse ano a professora Zélia Mariz, incentivada pelo escritor Diógenes da Cunha Lima, escreve um opúsculo sobre essa intelectual, publicando Nísia Floresta Brasileira Augusta. Trata-se da primeira mulher a publicar um livro sobre Nísia Floresta no Brasil até aquele momento.
  • Em 1985, no centenário de morte da escritora, diversas instituições natalenses se unem para repensar o nome de sua conterrânea. Ocorrem diversas palestras organizadas pela Fundação José Augusto, diversos artigos são divulgados na imprensa.
  • Em 1989 outro movimento em prol da memória de Nísia Floresta ocorre. Mas dessa vez é a cidade onde ela nasceu. Na ocasião houve palestras evolvendo escolas, caminhadas até o túmulo, reedição de Opúsculo Humanitário, organizado pela professora norte-americana Peggy Sharpe Valadares. Nessa ocasião estiveram presentes Zelia Maria Mariz, Graça Lucena, do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Assuntos da Mulher (NEPAM/UFRN), dentre outras autoridades.
  • Em 1992 o pesquisador sul-matogrossense Luís Carlos Freire escreveu a peça teatral História de Nísia Floresta, encenada em ambientes públicos com moradores do próprio lugar, com destaque para Simone Barros, Marcelo Borba, Niseuda Nascimento, Patrícia Nascimento, Kátia de Marlene, Neto, ‘Fia’ e ‘Vá’. Posteriormente exibida na Universidade Federal de São Luiz, no Maranhão e na UFRN. Em 1997 o Conselho Estadual da Mulher promoveu um seminário com palestras de Maria Simonetti Gadelha Grillo, Zélia Mariz, Luís Carlos Freire, Enélio Petrovich e da então prefeita de Natal, Vilma Faria.

  • Nos anos de 1994 a 2000, Luís Carlos Freire organizou no município diversos seminários, conferências, simpósios e exposições referentes a Nísia Floresta. Tais eventos tiveram participações importantes, como Françoise Dominique Valéry (Cônsul Honorária da França), Dr. Diógenes da Cunha Lima (Escritor e ex-reitor da UFRN), Zélia Mariz (escritora), Enélio Petrovich (Presidente do Instituto Histórico e Geográfico do RN), Zelma Bezerra Furtado De Medeiros (Presidente da Academia Feminina de Letras do RN), dentre diversos intelectuais e escritores.
  • Entre 1993 a 1997, Luís Carlos Freire apresentou e publicou diversos trabalhos nos anais da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência – SBPC, nos anais da Semana de Humanidades da UFRN, e durante Seminários, Simpósios e Conferências, todos referentes a Nísia Floresta na UFRN, UFMG, UFMA, USP e UNICAMP.
  • Em 2002, em parceria com a TV Universitária e apoio da Base Naval, da Base Aérea de Natal, da Escola Doméstica e da Fundação José Augusto, Luís Carlos Freire produziu um vídeo-documentário reconstituindo a chegada dos despojos de Nísia Floresta a Papari, filmado no largo da Igreja Matriz de Nossa Senhora do Ó.
  • O set de filmagem contou com a participação de um avião de época, cedido pela Base Aérea de Natal. Teve duzentos figurantes, dentre pessoas do próprio município, alunas da Escola Doméstica e soldados da Marinha e Aeronáutica. O evento transformou-se numa festa, atraindo pessoas dos municípios vizinhos. Uma multidão inesperada concentrou-se nas imediações para assistir as filmagens. Cena muito curiosa ocorria a cada vez que o avião despejava os panfletos, em voos rasantes, sobre o átrio da Matriz, pois a multidão, eufórica, aplaudia e gritava.
  • Na ocasião foram reproduzidos dez mil panfletos, exatamente iguais aos que foram despejados em 1954. Um dos lados trazia um retrato de Nísia Floresta, e o outro uma síntese da biografia da escritora, preparada por Luis da Câmara Cascudo.
  • Em 2006 a Fundação Assis Chateaubriand, em parceria com a Fundação Banco do Brasil lançou um concurso nacional de redação com a temática Nísia Floresta uma mulher à frente do seu tempo, para alunos de todos os níveis de ensino, sendo contemplados dois alunos moradores de Nísia Floresta: Newton Bruno do Nascimento e Fídias Augusto Cavalcanti Marques Peixoto Freire.
  • No mesmo ano a Fundação Banco do Brasil distribuiu pelo país um Kit sobre Nísia Floresta, contendo um livro foto-biográfico, um almanaque, um DVD e um VHS com um documentário sobre a escritora. Na ocasião confeccionaram folders e grandes banners, os quais empreenderam exposições em todos os estados brasileiros. O referido trabalho foi fundamentado nos acervos dos pesquisadores Constância Lima Duarte Luís e Carlos Freire, os quais participam do documentário contando a história de Nísia Floreta. A memória da potiguar triunfou, sendo reconhecida nacionalmente.
  • Ultimamente o município possui um museu sobre a intelectual Nísia Floresta e assuntos afins, idealizado e organizado por Raimundo Melo.
Luís Carlos Freire explicando para o Comandante da Base Aérea do Natal, Brg. Luiz Rezende, como deve ser o sobrevoo do avião que despejará os 10.000 panfletos durante a gravação do documentário.
  • “GIRO RÁPIDO” SOBRE NÍSIA FLORESTA

  • 1810 — Nasceu no dia 12 de outubro, filha do advogado português Dionísio Gonçalves Pinto Lisboa e da brasileira Antônia Clara Freire, no Sítio Floresta, em Papari (RN). Seu nome de batismo era Dionísia Gonçalves Pinto, mas desde a primeira publicação adotou o pseudônimo de Nísia Floresta Brasileira Augusta.
  • 1823 — Aos treze anos, casou-se com Manuel Alexandre Seabra de Melo, mas separou-se em alguns meses e voltou a residir com os pais.
  • 1824 — Devido ao clima de revolta que dominava a região, a família de Nísia transferiu-se para Pernambuco e residiu, primeiro em Goiana, depois em Olinda e Recife.
  • 1828 — Em 17 de agosto, Dionísio Gonçalves Pinto Lisboa foi assassinado nas proximidades de Recife. No mesmo ano, Nísia Floresta passou a residir em companhia de um acadêmico da Faculdade de Direito, Manuel Augusto de Faria Rocha.
  • 1830 — Em 12 de janeiro nasceu a filha Lívia Augusta, que será sua companheira nas viagens pela Europa e futura tradutora.
  • 1831 — Nísia Floresta estreou nas letras através do jornal Espelho das Brasileiras, dedicado às senhoras pernambucanas e que pertencia ao tipógrafo francês Adolphe Emille de Bois Garin. Durante trinta números do jornal (de fevereiro a abril), Nísia colabora com artigos que tratam da condição feminina em diversas culturas.
  • 1832 — Publicação do primeiro livro: Direitos das mulheres e injustiça dos homens. O pseudônimo escolhido revela sua personalidade e opções existenciais: Nísia, diminutivo de Dionísia; Floresta, para lembrar o sítio Floresta; Brasileira, para afirmar o sentimento nativista; e, Augusta, uma provável homenagem a Manuel Augusto. Neste ano, Nísia, o companheiro e a filha transferem-se para Porto Alegre (RS).
  • 1833 — Em 12 de janeiro, no mesmo dia em que Lívia havia nascido três anos antes, nasce outro filho que recebe o nome de Augusto Américo. Sai em Porto Alegre a segunda edição de Direitos das mulheres e injustiça dos homens. Mas em 29 de agosto, Manuel Augusto morre repentinamente aos vinte e cinco anos, deixando-a com os dois filhos pequenos.
  • Minha irmã, Lúcia Freire Mainente, meu sobrinho Rafael, minha mãe, Maria Freire e minha irmã Regina Freire Oliveira

  • 1837 — Em meio à Revolução Farroupilha que agitava as plagas sulistas, Nísia Floresta transferiu-se para o Rio de Janeiro.
  • 1838 — Através dos jornais da Corte ela anuncia a inauguração de um estabelecimento de ensino, o "Colégio Augusto", cujo nome é uma homenagem ao companheiro precocemente desaparecido.
  • 1839 — Sai a terceira edição de Direitos das mulheres e injustiça dos homens, no Rio de Janeiro.
  • 1842 — Publicação de Conselhos à minha filha, no Rio de Janeiro. O livro, dedicado à filha Lívia como presente pelo aniversário de doze anos, será o trabalho de Nísia mais editado e traduzido.
  • 1845 — Segunda edição de Conselhos à minha filha, no Rio de Janeiro, acrescentada de quarenta pensamentos em versos.
  • 1847 — Três novas publicações vêm à luz no Rio de Janeiro: Daciz ou A jovem completa, uma historieta oferecida às educandas do colégio; Fany ou O modelo das donzelas, publicado em 8 de abril de 1847, pelo Colégio Augusto, com uma proposta moralista semelhante; e Discurso que às suas educandas dirigiu Nísia Floresta Brasileira Augusta, pronunciado no encerramento das aulas do Colégio Augusto, em 18 de dezembro de 1847.
  • 1849 — Primeira edição de A lágrima de um Caeté, no Rio de Janeiro, sob o pseudônimo de Telesila. O poema de 712 versos trata da degradação do índio brasileiro e do drama vivido pelos liberais durante a Revolução Praieira, reprimida em Pernambuco em fevereiro desse mesmo ano. Nísia Floresta embarca para a Europa com os dois filhos, no dia 2 de novembro.
  • 1850 — Mesmo residindo em Paris, é publicado, em Niterói, o romance histórico Dedicação de uma amiga, em dois volumes.
  • 1852 — Em 27 de janeiro embarca em Lisboa, rumo ao Brasil, onde vai permanecer por cerca de dois anos. Durante este período, ela aproveita para vender parte das terras que havia herdado no Nordeste.
  • 1853 — Publicação de Opúsculo humanitário, no Rio de Janeiro, onde a autora condena a formação educacional da mulher, não só no Brasil como em diversos países.
O pesquisador Luís Carlos Freire mandou confeccionar o busto de Nísia Floresta, sob os cuidados do artista plástico Índio, e doou  a obra para a EMYP.

  • 1855 — O Jornal
    O Brasil Ilustrado, de 14 de março a 30 de junho, publica em oito capítulos o texto "Páginas de uma vida obscura", que traz a história de um negro escravo e o que a autora pensava, na época, acerca da escravidão. Em 15 de julho outro texto veio a público no mesmo jornal: "Passeio ao Aqueduto da Carioca", em que ela se faz de cicerone e passeia com o turista pela cidade do Rio de Janeiro.
  • 1856 — Em 31 de março, O Brasil Ilustrado publicava "O Pranto Filial", onde a escritora expõe a dor pela perda da mãe e o sentimento de orfandade que a consumia. Também neste ano foi publicado um livro de versos: Pensamentos. Em 10 de abril, Nísia Floresta iniciava a segunda viagem rumo à Europa, acompanhada apenas por Lívia pois Augusto Américo permaneceu no Rio de Janeiro, estudando. Somente após dezesseis anos ela tornará a ver a paisagem carioca e seus parentes. O Colégio Augusto fecha definitivamente suas portas neste ano. A escritora recebe em sua residência o filósofo Auguste Comte, e também é deste ano a correspondência trocada entre eles, num total de catorze cartas.
  • 1857 — Em 5 de setembro morria Auguste Comte. Nísia Floresta foi uma das quatro mulheres que acompanhou o cortejo fúnebre ao Père Lachaise. É publicado em Paris Itinéraire d'un voyage en Allemagne. O livro, sob a forma de cartas dirigidas ao filho e aos irmãos, contém as impressões da autora sobre as cidades alemãs. A primeira carta é de Bruxelas, de 26 de agosto de 1856 e, a última, de Estrasburgo, de 30 de setembro do mesmo ano.
  • 1858 — Primeira edição de Consigli a mia figlia, traduzida para o italiano pela própria autora. A publicação se dá em Florença e os quarenta pensamentos em verso da edição brasileira apareceram em prosa.
  • 1859 — A Associação da Propaganda de Valença imprimiu a segunda edição italiana do Consigli a mia figlia, que havia sido recomendado pelo Bispo de Mandovi para uso nas escolas católicas de Piemonte. Ainda neste ano, sai a edição francesa de Conseils à ma fille, em Florença, traduzido por Braye Debuysé; e, também em Florença, vem a público Scintille d' un' anima brasiliana, que reúne cinco ensaios: "Il Brasile", "L'abisso sotto i fiori della civilità", "La donna", "Viaggio magnetico", "Una passeggiata al giardino di Lussemburgo". Durante este ano e nos dois seguintes, a autora viaja através da Itália e da Grécia, residindo em diversas cidades.
  • 1860 — Uma edição italiana de Le lagrime de un Caeté, traduzido por Ettore Marcucci, com um prefácio muito elogioso à autora, surge em Florença.
  • 1864 — Publicação do primeiro volume de Trois ans en Italie, suivis d'un voyage en Grèce, em Paris. Nesse livro, Nísia Floresta debate os problemas políticos e sociais italianos e reflete sobre a escravidão, a história e as manifestações culturais da Itália.
  • 1867 — É publicada em Londres a tradução inglesa de um dos ensaios de Scintille: "La donna". Trata-se de Woman, por F. Brasileira Augusta, traduzido do italiano por Lívia A. de Faria, filha da escritora. Também é publicado em Paris o romance Parsis, que, apesar de constar entre os títulos de Nísia, não é conhecido nenhum exemplar desse livro.
  • 1871 — É publicado Le Brésil, em Paris, também traduzido por Lívia Augusta.
  • 1872 — Publicação do segundo volume de Trois ans en Italie, suivis d'un voyage en Grèce, em Paris. Após dezesseis anos no exterior, em 31 de maio, Nísia desembarca no Rio de Janeiro. Também nesta ocasião ela vai aproveitar para vender suas terras.
  • 1875 — Em 24 de março, Nísia Floresta retorna à Europa. O primeiro destino foi a Inglaterra, onde a filha a aguarda, e, após alguns meses, seguiu para Lisboa.
  • 1878 — Publicação de Fragments d'un ouvrage inèdit - notes biographiques, em Paris. Apesar de conter principalmente informações a respeito do irmão, Joaquim Pinto Brasil, este livro traz também dados biográficos da autora, até então desconhecidos. Nísia transferiu sua residência para Rouen e, em seguida, para Bonsecours, interior da França.
  • 1885 — Em 24 de abril, às nove horas da noite, Nísia Floresta Brasileira Augusta morria vitimada por uma pneumonia. Dias depois, era enterrada num jazigo perpétuo no Cemitério de Bonsecours.
  • 1954 — Em 12 de setembro, os restos mortais da escritora foram trasladados para o Rio Grande do Norte, e enterrados em Papari que, aliás, já se chamava Nísia Floresta. Seu mausoléu foi construído próximo do local da antiga residência do Sítio Floresta.


  • AO LONGO DA SUA ATUAÇÃO, NÍSIA FLORESTA ESCREVEU 15 LIVROS – NEM TODOS FORAM ESCRITOS EM PORTUGUÊS, MAS EM FRANCÊS, ITALIANO E INGLÊS. EIS SUA BIBLIOGRAFIA E BREVE SÍNTESE SOBRE CADA UMA:

  • CONSELHOS A MINHA FILHA”, recomendado para uso nas escolas da Itália, demonstra o quanto ela foi admirada. Mas as narrativas de “Daciz ou o Modelo das Donzelas” e “Parsis”, porém, continuam totalmente desconhecidas, pois, destes livros, nunca foi encontrado nenhum exemplar.
  • Seu título mais divulgado, “DIREITO DAS MULHERES E INJUSTIÇA DOS HOMENS”, não foi o que teve maior número de edições. Mas é o que melhor reflete seu pensamento, publicado quando a autora tinha apenas 22 anos.
  • Artigos, poemas, romances, novelas didático-moralistas. A obra de Nísia Floresta é composta por diferentes categorias literárias, que incluem, ainda, narrativas de viagem e a publicação de um discurso seu. Em cada parágrafo, seu estilo elogiável revela uma profunda erudição. E, mais que seu conteúdo, a inovação na forma fez com que ela fosse reconhecida como uma das grandes escritoras brasileiras do século XIX.

  • 1 - DIREITO DAS MULHERES E INJUSTIÇA DOS HOMENS
  • 1ª edição: Recife – Typographia Fidedigma, 1832.
  • 2ª edição: Porto Alegre – Typographia de V. F. de Andrade, 1833.
  • 3ª edição: Rio de Janeiro – [ ], 1839.

  • É o primeiro livro de Nísia Floresta. Nele, a autora contesta a situação em que as mulheres viviam em seu tempo, praticamente enclausuradas e recebendo um nível de educação muito inferior ao dos homens. É com esta obra também que ela passa a adotar o pseudônimo de “Nísia Floresta Brasileira Augusta”, revelando assim diferentes aspectos de sua personalidade: “Nísia” é o diminutivo de Dionísia; “Floresta”, uma referência ao sítio onde nasceu; “Brasileira”, a afirmação de sua profunda nacionalidade; e “Augusta”, uma homenagem ao segundo companheiro e pai de seus filhos, morto quando tinha apenas 25 anos.

  • Trecho de “Direitos das Mulheres e Injustiça dos Homens”, defendendo a emancipação feminina: “Os homens não podendo negar que nós somos criaturas racionais, querem provar-nos a sua opinião absurda, e os tratamentos injustos que recebemos, por uma condescendência cega às suas vontades; eu espero, entretanto, que as mulheres de bom senso se empenharão em fazer conhecer que elas merecem um melhor tratamento e não se submeterão servilmente a um orgulho tão mal fundado”.

  • 2 - CONSELHOS A MINHA FILHA1ª edição Rio de Janeiro – Typographia de J. S. Cabral, 1842.
  • 2ª edição (com 40 pensamentos em versos): Rio de Janeiro – Typographia de F. de Paula Brito, 1845.

  • O segundo livro de Nísia Floresta foi escrito como presente de aniversário para sua filha, Lívia Augusta, quando esta iria completar 12 anos. É seu trabalho mais traduzido e editado, em que ela assina como “F. Augusta Brasileira”. Aliás, assinar livros com variações de seu pseudônimo viria a se tornar uma prática constante em sua obra.
  • Trecho de “Conselhos à Minha Filha”: “Minha querida filha, há no mundo duas sortes de admiradores de nosso sexo, uma assaz comum, outra extremamente rara. A primeira é daqueles homens que, olhando-nos com desprezo, não veem em nós, assim como nessas lindas flores que se colhem para servir-nos de um ornato passageiro, mais do que um objeto digno somente de lisonjear seus sentidos. A seus olhos, uma mulher amável é sempre aquela que reúne mais graças exteriores e, ousados pela fraqueza com que os prejuízos de nossa educação nos apresentam aos olhos do mundo, eles têm estudado e põem em prática uma linguagem toda engenhosa para atrair nossa atenção e triunfar dessa fraqueza a despeito de nossa virtude mesma.”

  • 3 - FANY OU O  MODELO DAS DONZELAS
  • Rio de Janeiro – Edição do Colégio Augusto, 1847.

  • Trata-se de uma novela didático-moralista escrita por Nísia Floresta para suas alunas do Colégio Augusto. Nunca foi achado nenhum exemplar, porém, o manuscrito original, que se encontrava na biblioteca da família de Antônio Borges de Medeiros, foi doado ao historiador Fernando Osório Filho, em 1935, que incluiu o texto em seu livro “Mulheres Farroupilhas”. Fany representa a jovem perfeita, cujas virtudes todas as donzelas deveriam imitar. A história se passa durante a Guerra dos Farrapos, presenciada pela escritora durante o período em que viveu na capital gaúcha.
  • Trecho de “Fany ou o Modelo das Donzelas”, em que Nísia Floresta faz uma descrição de Porto Alegre: “A capital de S. Pedro do Sul está situada em uma risonha e agradável colina à margem oriental do Rio Jacuí. O habitante de Porto Alegre goza do ponto de vista o mais encantador e que pode despertar no homem a idéia sublime do Criador. De um lado vêem-se as águas dormentes do vasto rio lambendo as fraldas da colina, e trazendo ao porto embarcações carregadas de diversas mercadorias de outras províncias do Império e de diferentes nações do mundo; de outro avistam-se férteis campinas, semeadas aqui e ali de uma multidão prodigiosa de flores, cujas diferentes cores, formando o mais agradável contraste, trazem à imaginação o quadro que se nos traça desse Éden feliz, onde a soberana Bondade de Deus colocou o primeiro homem; quadro que é completado pela simplicidade e lhaneza dos excelentes habitantes desses campos, que hora descrevo. Chácaras, onde abundam saborosos frutos da Europa, se oferecem aos olhos do contemplador, que se extasia à vista da simetria com que ali brotam as roseiras e os cravos de todas as qualidades sem exigirem difícil cultura. As frentes da maior parte dessas chácaras, coroadas de rosas e como que situadas por entre o azul do céu e o verde das montanhas, apresentam no delicioso Outubro um panorama digno do pincel de Rafael!”.

  • 4 - DACYZ OU A JOVEM COMPLETA
  • Rio de Janeiro – Typographia de F. de Paula Brito, 1847.

  • Assim como “Fany ou o Modelo das Donzelas”, esta obra é uma novela didático-moralista, cuja narrativa integral é desconhecida, pois também nunca se achou nenhum exemplar. São conhecidas apenas as referências à obra, encontradas em antigos dicionários bibliográficos.

  • 5 - DISCURSO QUE ÀS SUAS EDUCANDAS DIRIGIU NISIA FLORESTA BRASILEIRA AUGUSTA
  • Rio de Janeiro – Typographia Imparcial de F. de Paula Brito, 1847.

  • Em 18 de dezembro de 1847, Nísia Floresta encerrava o ano letivo do Colégio Augusto, com um pronunciamento a suas alunas. O discurso, repleto de conselhos às meninas, foi publicado logo em seguida em um pequeno opúsculo.

  • 6 - A LÁGRIMA DE UM CAETÉ
  • 1ª edição: Rio de Janeiro – Typographia de L. A. F. Menezes, 1849.
  • 2ª edição: Rio de Janeiro – Typographia de L. A. F. Menezes, 1849.

  • Poema de 712 versos escrito logo após a derrocada dos insurgentes da Revolta Praieira, ocorrida em Pernambuco. Nísia Floresta traça uma espécie de paralelo entre a opressão do Império aos nacionalistas e o sofrimento vivido pelo índio após a colonização portuguesa. Sua principal característica é o rompimento com a estética romântica, que retratava o índio sempre como guerreiro, porém aliado de Portugal. O caeté da escritora é inconformado com sua situação de subjugado e não demonstra traços de passividade, como o que era idealizado pelos demais escritores do Romantismo.

  • Trecho de “A Lágrima de um Caeté: “Lá, quando no Ocidente o sol havia / Seus raios mergulhado, e a noite triste / Denso-ebânico véu já começava / Vagarosa a estender por sobre a terra; / Pelas margens do fresco Beberibe, / Em seus mais melancólicos lugares, / Azados para a dor de quem se apraz / Sobre a dor meditar que a Pátria enluta! / Vagava solitário um vulto de homem, / De quando em quando ao céu levando os olhos, / Sobre a terra depois triste os volvendo...”.

  • 7 - DEDICAÇÃO DE UMA AMIGA
  • Niterói – Typographia Fluminense de Lopes & Cia, 1850.

  • Obra em dois volumes publicada no Brasil quando Nísia Floresta já havia se mudado para a Europa. Trata-se de um romance histórico, em que ela assina como “B. A.” (Brasileira Augusta). De acordo com historiadores, este é o primeiro romance publicado por alguém nascido no Rio Grande do Norte.

  • 8 - OPÚSCULO HUMANITÁRIO
  • Rio de Janeiro – Typographia de M. A. da Silva Lima, 1853.

  • Coletânea que reúne 62 artigos de Nísia Floresta, que foram publicados, apenas parcialmente, no jornal “Diário do Rio de Janeiro”, em 1853. Após o lançamento do livro, o jornal “O Liberal” publicou a série na íntegra, levando um total de 10 meses para veicular todos os capítulos. Trata-se de uma análise da escritora acerca da condição feminina, desde os tempos da antiguidade até seus dias, centrada no aspecto educacional. Nísia Floresta, mais uma vez, defende a educação feminina como chave para o progresso da sociedade.

  • Trechos de “Opúsculo Humanitário”: “O Brasil tinha já fornecido grande cópia de homens ilustrados pelos conhecimentos adquiridos em diferentes universidades da Europa, e a maior parte das brasileiras (mesmo as das primeiras cidades) não logravam a vantagem de aprender a ler.”
  • “Dizia-se geralmente que ensinar-lhes a ler e escrever era proporcionar-lhes os meios de entreterem correspondências amorosas, e repetia-se, sempre, que a costura e trabalhos domésticos eram as únicas ocupações próprias da mulher. Este preconceito estava de tal sorte arraigado no espírito de nossos antepassados, que qualquer pai que ousava vencê-lo e proporcionar às filhas lições que não as daqueles misteres, era para logo censurado de querer arrancar o sexo ao estado de ignorância que lhe convinha”.

  • 9 - PÁGINAS DE UMA VIDA OBSCURA – UM PASSEIO AO AQUEDUTO DA CARIOCA  - PRANTO FILIAL
  • Rio de Janeiro – Typographia de N. Lobo Vianna, 1854.

  • Publicação em livro de três artigos de Nísia Floresta escritos para o jornal “O Brasil Ilustrado”. O primeiro deles, “Páginas de uma Vida Obscura”, aborda os maus tratos dispensados aos negros cativos na época da escravidão. “Um Passeio ao Aqueduto da Carioca” é um dos textos ufanistas da escritora, em que ela descreve as belezas do Rio de Janeiro. E “Pranto Filial” foi concebido após a morte de sua mãe, fato que abalou profundamente Nísia Floresta. Este livro nunca foi localizado e seus textos só são conhecidos graças à sua publicação anterior na imprensa.

  • Trecho de “Pranto Filial”, sobre a morte da mãe de Nísia Floresta:E depois, quando fui procurar na Europa restabelecer a saúde da filha predileta tua, eram as tuas cartas que me davam forças na ausência para suportar a saudade que de ti me torturava. Paris, com todos os seus mágicos encantos, Londres, com todas suas pompas, não conseguiram distrair-me um instante de ti, ó minha mãe, e só no momento em que Deus permitiu-me a ventura de abraçar-te, o meu coração, transito de longas dolorosas saudades, mesmo na benéfica atmosfera dos gênios, em que o espírito se me banhava em ondas deliciosas de gozos intelectuais, se dilatou e expandiu-se em uma acumulação de sensações doces e fecundas, que só em teu seio podia eu encontrar e sentir!”

  • Trechos de “Páginas de uma Vida Obscura”:A escravidão, esse monstruoso parto do despotismo, esse infame libelo dos povos cristãos, foi sancionada pelos mesmos homens, que tudo haviam sabido sacrificar para libertar-se do jugo de seus opressores, e assumirem a categoria de nação livre! Eles, que acabavam de conquistar a liberdade, não coravam de rodear-se de escravos! Anomalia de um grande povo apresentada em caracteres de lágrimas e de sangue à face da civilização moderna para rebaixá-lo aos olhos da filosofia e da humanidade.”
  • “A África, sobre a qual ainda não aprouve a Deus mandar um reflexo de sua luz fazendo-a ressurgir das trevas da ignorância, purificada da maldição fulminada sobre a cabeça do seu primeiro povoador, forneceu à ambição e à tirania de certos homens um amplo meio de enriquecer-se no infame tráfico de outros homens!”
  • “Os negros d’África são mais infelizes vivendo ali livres, do que escravos em qualquer outra parte; nós lhes fazemos pois um bem arrancando-os à miséria em que vivem na sua pátria.’ Assim dizem geralmente impudentes e sofísticos mercadores que não se envergonham de mentir à humanidade e à sua própria consciência!”
  • “Mentir, porque bem lhes fariam se os fossem lá buscar como colonos sujeitos somente por um razoável número de anos de trabalho em proveito dos que lhes proporcionassem meios de transporte e de manutenção, mas não a um cativeiro perpétuo para si e seus descendentes!...”

  • Trecho de “Passeio ao Aqueduto da Carioca”:Espraia a vista pelos soberbos panoramas que daqui se desenrolam! Não sentes teus pulmões dilatarem-se, teu coração expandir-se, teu pensamento elevar-se ao Criador de tantas magnificências!?”.

  • 10 - ITINERAIRE D’UN VOYAGE EM ALLEMAGNE (ITIBERÁRIO DE UMA VIAGEM À ALEMANHA)
  • Paris – Firmin Diderot Frères et Cie, 1857.

  • Após percorrer a Alemanha, visitando diversas cidades, Nísia Floresta publicou sua primeira narrativa de viagem, em que ela descreve suas impressões acerca do país de Goethe. Escrito originalmente em francês, o relato é elaborado por meio de cartas que a escritora enviava ao filho e aos irmãos no Brasil, escritas quase que diariamente durante o trajeto.

  • Trecho de “Itinerário de uma Viagem à Alemanha”: “O canto dos pássaros de nossa pátria, aqui reduzidos à condição de prisioneiros, para servirem, mediante um franco por pessoa, de distração e prazer a uma população estrangeira, tocava melancolicamente meus ouvidos e despertou em meu espírito a lembrança das mais agradáveis paisagens que percorri outrora sob nosso belo céu! A deliciosa Floresta de antigamente, berço de meu nascimento, testemunha de minha inocente felicidade fraterna e de minhas primeiras lágrimas filiais! Beberibe, Jacuí, Petrópolis, Tijuca e os aquedutos de nossa Carioca apresentaram-se de uma vez e tão vivamente ao meu espírito, que parei, em êxtase, sob um conjunto de árvores espessas, subjugada por estranho poder, esquisita ilusão! Vocês estavam lá, em torno de mim: juntos, observávamos nossos verdes papagaios, empoleirados em galhos, e uma infinidade de outros seres alados de nosso país.”

  • CONSIGLI A MIA FIGLIA (CONSELHOS À MINHA FILHA)
  • 1ª edição: Firenze – Stamperia Sulle Logge del Grano, 1858.
  • 2ª edição: Mandovi – 1859.

  • É a tradução para o italiano de “Conselhos à Minha Filha”, feita pela própria autora. A partir da segunda edição, no ano seguinte, o livro se tornou leitura recomendada em diversas escolas italianas.

  • SCINTILLE D’UN ‘ANIMA BRASILIANA
  • Firenze – Tipografia Barbera, Bianchi & C. 1859.

  • Reúne, em italiano, cinco ensaios de Nísia Floresta: “Il Brasile” (O Brasil), “L'Abisso sotto i Fiori della Civilità” (O Abismo sob as Flores da Civilização), “La Donna” (A Mulher), “Viaggio Magnetico” (Viagem Magnética) e “Una Passeggiata al Giardino di Lussemburgo” (Um Passeio ao Jardim de Luxemburgo).

  • CONSEILS A MA FILLE (CONSELHOS ÀMINHA FILHA)
  • Firenze – Le Monnier, 1859.

  • É a versão francesa de “Conselhos à Minha Filha”, traduzido a partir da versão italiana, por Braye Debuysé.

  • LE LAGRIME D’UM CAETÉ (A LÁGRIMA DE UM CAETÉ
  • Firenze – Le Monnier, 1860.

  • Traduzido pelo escritor italiano Ettore Marcucci, bastante respeitado por seus contemporâneos, o livro traz um prefácio elogioso à autora, além de 41 notas que explicam o vocabulário do poema e o relacionam com Dante, Ariosto e a Bíblia.

  • TROIS ANS EM ITALIE, SUIVIS D’UM VOYAGE EM GRÈCE (TRÊS ANOS NA ITÁLIA, SEGUIDOS DE UMA VIAGEM À GRÉCIA) 1º Volume.
  • Paris – Libraire E. Dentu, 1864.

  • Escrito originalmente em francês e composto por dois volumes, desenvolve-se na forma de um diário de viagem, em que Nísia Floresta descreve os anos em que viveu em diferentes cidades italianas, passando também pela Grécia. A autora coloca em discussão a crise política e os problemas sociais da Itália quando de sua passagem pelo país, ocorrida justamente na época da unificação. A obra, na qual ela assina apenas “par une Brèsilienne”, é a que traz também suas críticas mais severas à escravidão no Brasil.

  • Trecho de “Três Anos na Itália, Seguidos de uma Viagem à Grécia”, sobre a escravidão no Brasil:Ó minha pátria querida, Éden desse mundo imenso e extraordinário, reaparecido ao olhar deslumbrado de Colombo, deixa, ah! deixa livremente explodir de teu nobre peito o grito humanitário, que sufocas penosamente, por força dos deploráveis preconceitos transmitidos por teus antigos dominadores de além-mar! Sê conseqüente com as instituições livres que te regem, com a religião que professas: quebra, oh! quebra os grilhões de teus escravos!

  • WOMAN (A MULHER)
  • London – Printed by G.Parker, Little St. Andrew Street, Upper. St. Martin's Lane, 1865.

  • Trata-se da tradução para o inglês de “La Donna” (A Mulher), feita pela filha da autora, Lívia Augusta, a partir do original em italiano. Configura-se em uma mistura de ficção, ensaio, crônica e texto didático, em que Nísia Floresta analisa a influência de uma formação moral adequada nas atitudes das mulheres adultas e condena radicalmente as amas de leite de aluguel.
  • Trecho de “A Mulher”, com a descrição do ambiente em que as personagens encontram uma criança que estava sendo criada no campo por uma ama de leite de aluguel:Um úmido aposento, sem ar, com um assoalho de pedras disformes cobertas de lodo; uma janela, ou melhor, um buraco, jogava como que uma réstia de luz sobre os sujos e velhos móveis que entulhavam aquela caverna humana, onde a panela do domingo fervia na enegrecida lareira. Uma cama, cujo escuro baldaquino ornava com o restante dos objetos espalhados aqui e ali, anunciava a desordem e a falta de qualquer asseio. A eira lotada de pútrido estrume tresandava, não menos que o quarto contíguo, um odor incômodo impossível de sustentar... As duas mulheres entreolharam-se sem que pudessem dizer palavra.”

  • FRAGMENTS D’UN OUVRAGE INÉDIT: NOTES BIOGRAPHIQUES (FRAGMENTOS DE UMA OBRA INÉDITA: NOTAS BIOGRÁFICAS)
  • Paris – A.Chérié Editeur, 1878.
  •                                                                                                              
  • É o último livro de Nísia Floresta publicado em vida. Traz principalmente informações sobre seu irmão, Joaquim Pinto Brasil, mas também muitos dados autobiográficos.

  • PARSIS
  • Paris – 1867.

  • Trata-se de um romance, mas nunca foi encontrado nenhum exemplar desta obra e sua narrativa é totalmente desconhecida, embora seja citada em todos os principais dicionários bibliográficos antigos.

  • LE BRÉSIL (O BRASIL)
  • Paris – Libraire André Sagnier, 1871.

  • É a versão francesa do artigo “Il Brasile” (O Brasil), publicado inicialmente como parte de “Cintilações de uma Alma Brasileira” e traduzido do italiano para o francês pela filha da autora, Lívia Augusta. Contém a defesa apaixonada de Nísia Floresta em relação às qualidades de sua pátria, empreendendo, no texto, um debate com os viajantes estrangeiros que faziam críticas ao Brasil.
  • Trecho de “O Brasil”:Todos os povos civilizados da terra precisam conhecer este amplo e rico país da América meridional, que se estende desde o majestoso Amazonas, o maior rio do mundo, até o Prata. Aí se encontram, além de uma infinidade de outros rios navegáveis, grandiosas florestas, reclinadas, a maior parte, por todo o seu perímetro em forma de admiráveis curvas; excelsos montes, cujos cumes parecem tocar o céu; pradarias risonhas de uma eterna vegetação: cheios uns e outras de quanto têm de flores e frutos o antigo e o novo mundo. A essas magnificências da natureza juntam-se os prazeres de uma civilização progressiva, espalhada em muitas de suas partes.”

  • TROIS ANS EM ITALIE, SUIVIS D’UN VOYAGE EM GRÈCE (TRÊS ANOS NA ITÁLIA, SEGUIDOS DE UMA VIAGEM À GRÉCIA) – 2º volume
  • Paris – E. Dentu Libraire-Éditeur et Jeffes, Libraire A. Londres, 1872.

  • Após oito anos da publicação do primeiro volume, sai a continuação de “Três Anos na Itália, Seguidos de uma Viagem à Grécia”, também em italiano.

  • FRAGMENTS D’UN OUVRAGE INÉDIT: NOTES BIOGRAPHIQUES (FRAGMENTOS DE UMA OBRA INÉDITA: NOTAS BIOGRÁFICAS).
  • Paris – A.Chérié Editeur, 1878.

  • É o último livro de Nísia Floresta publicado em vida. Traz principalmente informações sobre seu irmão, Joaquim Pinto Brasil, mas também muitos dados autobiográficos.
  • Colaboração em jornais

  • PASSEIO AO AQUEDUTO DA CARIOCA
  • Jornal “O Brasil Ilustrado”, Rio de Janeiro, em 15 de julho de 1855, páginas 68, 69 e 70.

  • PÁGINAS DE UMA VIDA OBSCURA - Jornal “O Brasil Ilustrado”, Rio de Janeiro, em 14 de março, 31 de janeiro, 15 de abril, 30 de abril, 15 de maio, 31 de maio, 15 de junho e 30 de junho, de 1855.

  • UM IMPROVISO, NA MANHÃ DE 1º DO CORRENTE, AO DISTINTO LITERATO E GRANDE POETA ANTONIO FELICIANO DE CASTILHO - Jornal “O Brasil Ilustrado”, Rio de Janeiro, em 30 de abril 1855, página 157.

  • O PRANTO FILIAL - Jornal “O Brasil Ilustrado”, Rio de Janeiro, em 31 de março de 1856, páginas 141 e 142.

  • CURIOSIDADES:

  • CONSELHOS A MINHA FILHA”, recomendado para uso nas escolas da Itália, demonstra o quanto ela foi admirada. Mas as narrativas de “Daciz ou o Modelo das Donzelas” e “Parsis”, porém, continuam totalmente desconhecidas, pois, destes livros, nunca foi encontrado nenhum exemplar.

  • Seu título mais divulgado, “DIREITO DAS MULHERES E INJUSTIÇA DOS HOMENS”, não foi o que teve maior número de edições. Mas é o que melhor reflete seu pensamento, publicado quando a autora tinha apenas 22 anos.
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  • Artigos, poemas, romances, novelas didático-moralistas. A obra de Nísia Floresta é composta por diferentes categorias literárias, que incluem, ainda, narrativas de viagem e a publicação de um discurso seu. Em cada parágrafo, seu estilo elogiável revela uma profunda erudição. E, mais que seu conteúdo, a inovação na forma fez com que ela fosse reconhecida como uma das grandes escritoras brasileiras do século XIX. FONTE: Constância Lima Duarte/Adauto da Câmara/Zélia Mariz/Luís Carlos Freire/Rodrigues Alves/Henrique Castriciano. Os textos do autor desttexto estão publicados mesmo blog.